Pular para o conteúdo principal

Uma luta intensa e real (Luta por Justiça)



Luta por Justiça lembra em alguns momentos o filme estrelado por Denzel Whashignton, Hurricane: O Furacão. Na trama Jamie Foxx é acusado por um crime que não cometeu. A acusação cai sobre os ombros do coadjuvante, que toma as rédeas como protagonista, enquanto aguarda  o dia da execução. Walter é negro e mora no Alabama. É o que basta para a sentença de morte. Bryan acredita na justiça e decide proporcionar um julgamento decente para Walter, não somente um julgamento, o protagonista proporciona esperança a Walter. A comparação com Hurricane é clara, porém, uma diferença crucial pode ser observada nos filmes: o ritmo. Hurricane é pulsante e Luta por Justiça é contemplativo. 

O grande trunfo do roteiro da dupla Andrew Lanham e Destin Daniel Cretton é humanizar os personagens. O filme ganha um ritmo contemplativo justamente por priorizar este aspecto. No primeiro ato Bryan precisa convencer a mãe de que ser formado em Harvad valeu a pena pelos motivos certos. O personagem deseja fazer a diferença para quem realmente necessita de justiça. A mãe é movida pelo sentimento protetor, pois sabe que o filho corre perigo. Após humanizar e contextualizar o núcleo familiar de Bryan, no decorrer dos atos, o roteiro explora ao máximo as camadas dos personagens. O foco não fica somente na trajetória de Walter, o roteiro ressalta os laços de amizade feitos na prisão e assim os coadjuvantes ganham destaque. Rob Morgan vive um veterano de guerra que matou uma jovem e também teve um julgamento injusto. As camadas dos personagens são exploradas de forma intensa provocando o envolvimento do espectador. Outro coadjuvante que ganha destaque nos mínimos detalhes é o policial Jeremy. Ele é claramente racista no começo da trama, mas aos poucos o personagem é humanizado. Infelizmente, não se pode dizer o mesmo da personagem de Brie Larson. Toda a subtrama do núcleo familiar de Eva poderia ser facilmente retirada do roteiro. 


Como o ritmo do filme é extremamente lento o elenco toma no decorrer dos atos a filme para si. Michael B. Jordan prova que busca amadurecimento em cada novo personagem. Com Bryan, o ator intensifica as emoções de forma contida e consegue elevar o protagonista. Como o objetivo do roteiro é humanizar cada personagem que aparece na tela, Michael explora muito bem as nuances de Bryan e os conflitos internos do personagem. Existe uma luta interna que Michael precisa travar, não somente contra o sistema, como também contra o racismo no sul dos Estados Unidos. Já Jamie Foxx faz jus a cada close que o diretor explora voltado para Walter. Existe uma indignação no olhar do ator que envolve o espectador toda vez que a narrativa é voltada para o personagem. Em vários momentos Jamie é o verdadeiro protagonista do filme. Quando o foco está nos demais personagens sentimos falta de Walter na tela. O ator empresta um misto de ternura e revolta de forma minimalista para Walter. 

Luta por Justiça reforça os elementos narrativos de forma discreta para ressaltar momentos importantes da trama. A fotografia presa por paleta de cores quentes quando Michael B. Jordan encontra com a família de Walter e em reviravoltas no caso quando o protagonista descobre provas da inocência do coadjuvante. A trilha surge em cenas pontuais e em rimas visuais. Quando Bryan chega à cidade e a vizinhança branca o olha com reprovação, a mesma cena é vista sob outro prisma quando Bryan visita a família de Walter pela primeira vez, a recepção é calorosa repleta de abraços. A direção de Destin prioriza o close em várias cenas que exigem uma dramaticidade maior do elenco. O recurso torna-se repetitivo e por vezes exalta o clichê presente em cenas decisivas no arco dos personagens. Existe o exagero de enquadramentos que são camuflados pela interpretação de Jamie e Michael. É inegável que a repetição de cenas cansa o espectador e prolonga o filme como um todo. Apesar dos equívocos na direção e alguns clichês, Luta por Justiça é um filme necessário baseado em fatos. Walter até hoje luta para proporcionar um julgamento justo para pessoas que são precipitadamente julgadas pela raça ou por pertencerem a uma classe social inferior. Impossível não perceber a ironia presente no contexto onde a trama é baseada. A cidade onde Walter é condenado foi a mesma que inspirou Harper Lee a escrever o clássico romance O Sol é para Todos. E pensar que ainda estamos a anos luz de superar o que o clássico da literatura e o cinema denunciam de forma tão intensa e real. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

"Isso parece uma novela" (Bad Boys Para Sempre)

O começo de Bad Boys Para Sempre é basicamente um resgate do primeiro filme dirigido por Michael Bay. Mike e Marcus estão em um carrão em alta velocidade trocando ofensas e piadas enquanto percegue suspeitos. Além de todas as referências, a trama gira em torno de vingança, uma vingança mexicana. Sim, os vilões são mexicanos. Bandidos de um lado, policiais do outro e segredos revelados.  Will Smith sabe como lucrar na indústria, apesar de algumas escolhas equivocadas em projetos passados, Bad Boys Para Sempre parece uma aposta acertada do produtor. Desde o primeiro longa a química entre os atores é o que move a trama e na sequência da franquia não seria diferente. Martin e Will são a ação e o tom cômico da narrativa. Os opostos são explorados de forma intensa. Martin está mais contido com a chegada do neto e Will na intensidade de sempre. As personalidades se complementam apesar da aposentadoria momentânea de Marcus. Tudo ganha contornos diferenciados quando a família em to...

O Mito. A lenda. O Bicho-Papão. (John Wick : Um Novo Dia Para Matar)

Keanu Reeves foi um ator que carregava consigo o status de galã nos anos 80. Superado o estigma de ser mais um rosto bonito em Hollywood, o que não se pode negar é a versatilidade do astro ao escolher os personagens ao longo de décadas. Após a franquia Matrix, Keanu conquistou segurança ao poder escolher melhor os personagens que gostaria de interpretar. John Wick é o novo protagonista de uma franquia que tem tudo para dar certo. Um ator carismático que compreendeu a essência do homem solitário que tinha com companhia somente um cachorro e um carro. Após os eventos do primeiro filme, De Volta ao Jogo, Keanu retorna com John Wick repetindo todos os aspectos narrativos presentes no filme de 2014, mas com um exagero que faz a sequência ser tão interessante quanto o anterior. O protagonista volta aos trabalhos depois de ter a casa queimada. Sim, se as motivações para toda a ação presente no primeiro filme eram o cachorro e um carro, agora, o estopim é uma casa. Logo na primeir...

Não, não é uma crítica (Coringa : Delírio a Dois)

Ok, o título estampado no cartaz é: Coringa: delírio a dois. Podemos criar expectativas que a continuação é um filme do Coringa, correto? Na realidade, o que Todd Phillips nos apresenta e faz questão de reforçar a cada cena é que temos o Coringa, porém, o protagonista é Arthur Fleck, um homem quebrado físicamente e mentalmente. Temos também Lee Quinzel, que projeta no outro um sentido na vida e começa a manipular Arthur, para que Arlequina venha à tona. Podemos refletir sobre a manipulação da personagem, ela inclusive reforça:"Não assisti ao filme vinte vezes, talvez umas quatro ou cinco. Quem não mente?". Mas dizer que ela é culpada pelas atitudes de Arthur/ Coringa? A coerência existe no fato da personagem possuir um transtorno mental e, por isso, justifica o desejo e manipulação. Agora, qual a necessidade de criar uma pauta inexistente? O grande equívoco talvez seja do próprio estúdio em não vender o filme como musical e gerar expectativas equivocadas no espectador. É um f...