Um Lindo Dia na Vizinhança é baseado em um artigo escrito por Tom Junod, jornalista investigativo que reluta em escrever um perfil sobre o apresentador de programa infantil Fred Rogers. Tom trabalha para a revista Esquire e é conhecido por ser implacável com as palavras. Tom aceita o desafio e no meio do caminho ele estabelece uma bela amizade com o apresentador. A trama é centrada no arco de Matthew Rhys e como o protagonista precisa aos poucos lidar com os conflitos internos de Tom. O ator entre os atos intensifica o olhar melancólico e resistência ao criar laços afetivos com a figura paterna. Apesar de o protagonismo ser de Matthew quem rouba o filme para si é Tom Hanks. O ator abraça a figura de Rogers com tamanho comprometimento que é impossível ver outro ator interpretando o personagem. São trejeitos e uma voz com o timbre tão suave que transparece toda a paz que o verdadeiro Fred tinha ao cativar inúmeras crianças. Não é à toa que a primeira cena é a abertura do programa infantil com Tom Hanks convidando o espectador para acompanhar a história do amigo Tom. É inevitável que Matthew fique ofuscado em vários momentos quando contracena com Tom Hanks. Mesmo que o trabalho de Matthew seja minimalista falta intensidade para o ator lidar com as emoções do protagonista. Nos momentos de maior dramaticidade quem brilha é Chris Cooper deixando o ator aquém da força de Tom.
Infelizmente o roteiro parte do pressuposto que o espectador já tenha um conhecimento prévio de Fred Rogers porque tudo que remete ao personagem é somente citado sem o devido aprofundamento do coadjuvante. Esse aspecto acontece em várias cenas relacionadas à figura de Rogers. Pela importância do personagem, o roteiro poderia explorar devidamente a aura do Fred. Sim, o foco é o estudo do personagem do jornalista em busca de uma reconciliação com o passado, mas nada impede que o roteiro desenvolva com maior propriedade o personagem de Tom Hanks. Uma pena que o espectador fique sabendo somente de alguns detalhes da vida do coadjuvante. Se não fosse pelo trabalho de Hanks, talvez o filme não tivesse tanta força para impulsionar a figura do coadjuvante clássico. Os diálogos voltados para o arco do jornalista são pobres e provocam o afastamento do espectador. Para contribuir com esse aspecto a montagem corta praticamente todas as cenas que poderiam gerar empatia pelo jornalista. A cena do tigre teria um impacto maior se ambos fossem desenvolvidos com profundidade. Rogers fala que estravasa a raiva no piano e lamenta a relação que teve com os filhos e Tom se fecha completamente. No término do filme o espectador sabe de forma superficial um pouco do arco de Tom e Rogers.
O que aumenta o distanciamento do espectador além da falta de desenvolvimento no arco dos personagens é a forma como a diretora Marielle Heller conduz à narrativa. Para criar uma atmosfera melancólica a diretora aposta em um ritmo mais contemplativo, porém, não existe vigor e pulso nas cenas. Toda a narrativa ganha um ritmo arrastado e cansativo. As cenas de maior dramaticidade passam batidas para o espectador. É a junção entre atuação, roteiro e direção que prejudica o filme como um todo. Porém existe um zelo ao explorar detalhes do programa de Rogers. A trilha do programa embala as passagens sentimentais do protagonista e as transições de determinadas cenas são exploradas por maquetes do programa. Podemos comparar a direção do filme com o trem tão característico presente no programa infantil de Rogers. Aqui o trem nunca possui força suficiente e sempre existe um empecilho que o impede de seguir em frente. Vale assistir ao tocante documentário Won´t You Be My Neighbor? que aborda de forma completa o estudo da persona de Fred Rogers. Como complemento o documentário porporciona força ao trem. Mas se o espectador necessita de um material extra para compreender o arco do coadjuvante é um claro sinal de falta de desenvolvimento no roteiro. Enfim, Um Lindo Dia na Vizinhança deixa o espectador somente observando o trem se deslocar de forma melancólica até o ato final.
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