Pular para o conteúdo principal

A grandiosidade do uniforme laranja (Aquaman)


Sabe a sensação de estar anestesiado? James Wan consegue provocar esse sentimento no espectador após a sessão de Aquaman. O diretor é sinônimo de criatividade ao entregar para os fãs e o público sedento por entretenimento, um filme que enfatiza a origem do super-herói mantendo o ritmo constante entre os atos. O primeiro contato é voltado para o romance de Tom Curry e Atlanna. Os pais do protagonista se conhecem e com poucos minutos a trama enfatiza o retorno de Atlanna para Atlântida visando a segurança da família. O retorno é marcado pelo nascimento de outra criança e o exílio da personagem. Enquanto isso, na terra, Aquaman salva vidas inocentes e tira selfie em um bar. O filme transita entre o passado e presente do personagem com flashbacks, tudo voltado para a criatividade sem limites do diretor.

O que torna Aquaman diferente dos demais filmes do universo DC? Autoria. O ponta pé inicial foi dado em Mulher-Maravilha. Patty Jenkins abriu portas para a autoria em filme solo no universo DC. Assim, James Wan teve a liberdade necessária para explorar ao máximo O Rei dos Mares. A criatividade é tamanha que os efeitos visuais envolvem de tal forma o espectador tornando o fascínio imediato. Uma infinidade de cores, luzes e trilha psicodélica proporcionam uma nova abertura para a DC nos cinemas. O roteiro gira em torno de dois núcleos: Terra e Atlântida. Apesar de James Wan ter o total domínio das cenas de ação, o primeiro núcleo, não consegue manter a mesma intensidade do segundo. Obviamente que as cenas de ação na terra são um atrativo dentro da trama, mas quando Atlântida é explorada o filme ganha outra dinâmica. Os personagens impulsionam o arco do protagonista e complementam a origem do herói. Tudo é explorado de forma cadênciada para que aos poucos o espectador compreenda os dilemas de Arthur. Tudo bem que o espectador fica sem compreender como Jason Momoa vira um Indiana Jones no deserto na metade do segundo ato. Deslize do roteiro. Tudo bem o protagonista perceber de forma tão conveniente que algumas criaturas são sensíveis à luz. Enfim, nada que tire a empolgação do filme. 

Interessante perceber como o elenco, ou pelo menos grande parte dele, compreende perfeitamente os personagens. Se o núcleo voltado para a terra não possui o mesma atração do núcleo de Atlântida, Willem Dafoe consegue transitar perfeitamente por ambos. O mesmo não se pode dizer de Amber Heard. Se no trailer Mera já transmitia a sensação de não ter química alguma com Momoa, o filme comprova que o casal não possui força dentro da trama. Os momentos que geram timing cômico entre o casal não funcionam durante os atos. Como os atores passam boa parte do filme juntos, o espectador sente a falta de entrosamento em toda a trama. Nicole Kidman parece deslocada no papel de Atlanna. Já Patrick Wilson encontra o tom perfeito para o meio-irmão de Aquaman. O ator consegue impor presença sem ser caricato. A busca pelo poder não o torna cansativo. Dolph Lundgren é a presença oitentista que casa com a trilha proposta para o núcleo de Atlântida. Mas o que impulsiona a trama é o tom que Jason Momoa encontra para Aquaman. Claro que o físico auxilia na construção do protagonista, mas os olhares e o domínio das cenas presente nas coreografias de luta reforçam a aura do personagem.


A  criatividade de James Wan ao dirigir um universo totalmente novo sem as amarras da visão particular de Snider, o fez embarcar em algo que poderia dar muito certo ou muito errado. Wan consegue imprimir autoria e faz o público ter empatia pelo protagonista. A montagem também auxilia na aproximação com o espectador. Em momentos pontuais o público conhece mais sobre o treinamento e passado de Arthur. A trilha ganha tons que impulsionam a trama envolvendo de forma diferenciada o espectador. Apesar de algumas conveniências dentro do roteiro, os demais elementos narrativos proporcionam uma experiência nova para o universo DC.

Aquaman é um filme que presa pela criatividade, liberdade e autoria. James Wan consegue entregar ao espectador a fidelidade dos quadrinhos recentes do herói e coloca um ponto final na imagem que o protagonista teve durante anos. Tudo bem que a liberdade levou Aquaman para lugares exóticos beirando o Indiana Jones, mas Wan possui grandes méritos ao exagerar na imagem imponente do personagem. Quem lembra dos desenhos quando se tem a grandiosidade de Momoa em um uniforme laranja?

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Não, não é uma crítica (Coringa : Delírio a Dois)

Ok, o título estampado no cartaz é: Coringa: delírio a dois. Podemos criar expectativas que a continuação é um filme do Coringa, correto? Na realidade, o que Todd Phillips nos apresenta e faz questão de reforçar a cada cena é que temos o Coringa, porém, o protagonista é Arthur Fleck, um homem quebrado físicamente e mentalmente. Temos também Lee Quinzel, que projeta no outro um sentido na vida e começa a manipular Arthur, para que Arlequina venha à tona. Podemos refletir sobre a manipulação da personagem, ela inclusive reforça:"Não assisti ao filme vinte vezes, talvez umas quatro ou cinco. Quem não mente?". Mas dizer que ela é culpada pelas atitudes de Arthur/ Coringa? A coerência existe no fato da personagem possuir um transtorno mental e, por isso, justifica o desejo e manipulação. Agora, qual a necessidade de criar uma pauta inexistente? O grande equívoco talvez seja do próprio estúdio em não vender o filme como musical e gerar expectativas equivocadas no espectador. É um f...

Uma guerra que está longe de acabar (Um Estado de Liberdade)

O período era a Guerra Civil Americana e o fazendeiro Newton Knight foi convocado para lutar, mas vários questionamentos lhe inquietavam: Morrer com honra defendendo a Nação? Qual o objetivo da guerra? Quais eram as verdadeiras motivações? Após perder o sobrinho, Knight responde ao companheiro: "Ele não morreu com honra, ele simplesmente morreu." O protagonista leva o corpo do jovem para a mãe e a partir deste momento é considerado desertor. Determinado e ao mesmo tempo refugiado em um Pântano com escravos foragidos, o personagem torna-se líder de causas significativas: A independência do Estado de Jones, no Mississippi e a questão racial.  A narrativa peca em alguns aspectos no roteiro por explorar subtramas desnecessárias que desviam o foco da trama principal. A montagem prejudica o ritmo do filme ao enfatizar a história de um parente distante de Knight. O mesmo acontece com a primeira esposa do personagem, interpretada por Keri Russel. O núcleo familiar é aprese...

"Isso parece uma novela" (Bad Boys Para Sempre)

O começo de Bad Boys Para Sempre é basicamente um resgate do primeiro filme dirigido por Michael Bay. Mike e Marcus estão em um carrão em alta velocidade trocando ofensas e piadas enquanto percegue suspeitos. Além de todas as referências, a trama gira em torno de vingança, uma vingança mexicana. Sim, os vilões são mexicanos. Bandidos de um lado, policiais do outro e segredos revelados.  Will Smith sabe como lucrar na indústria, apesar de algumas escolhas equivocadas em projetos passados, Bad Boys Para Sempre parece uma aposta acertada do produtor. Desde o primeiro longa a química entre os atores é o que move a trama e na sequência da franquia não seria diferente. Martin e Will são a ação e o tom cômico da narrativa. Os opostos são explorados de forma intensa. Martin está mais contido com a chegada do neto e Will na intensidade de sempre. As personalidades se complementam apesar da aposentadoria momentânea de Marcus. Tudo ganha contornos diferenciados quando a família em to...