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Uma bela homenagem ao cinema clássico Hollywoodiano (A Luz Entre Oceanos)


O período é o pós Primeira Guerra Mundial e Tom Sherbourne vive as marcas de ser um veterano de guerra. Tentando apagar os horrores que viveu é contratado para permanecer e trabalhar em um farol, localizado na divisão entre os oceanos Pacífico e Índico. Tendo como companhia as lembranças de vários homens que matou e a solidão, Tom não almeja muitas mudanças. Após meses relata o que presenciou e leva informações para o responsável que o contratou. Em um dos deslocamentos conhece a família da Isabel Graysmark e o casamento torna-se inevitável. A jovem nutre sentimentos reprimidos pela perda dos irmãos e um novo amor é uma maneira de começar novamente a viver e Tom encontra na jovialidade de Isabel a alegria que havia perdido por ter vivenciado os conflitos e combates da Guerra.

O tom da narrativa logo no primeiro ato já deixa pistas para o espectador que ele irá assistir um filme que faz uma bela homenagem ao cinema clássico de Hollywood. A paleta de cores quentes, com destaque para a imensa paisagem do farol e do mar aberto lembram as cenas de filmes como ...E o Vento Levou, onde o espectador é totalmente imerso no ambiente vivido pelos personagens. Ela deseja muito ser mãe e não demora para contar radiante ao marido que está grávida. O som diegético vindo dos oceanos acompanha a felicidade do casal. A câmera alterna takes dos protagonistas com belas paisagens como pano de fundo. O tom dramático da narrativa exalta ainda mais os filmes clássicos. A dor que Alicia Vikander transmite para Isabel por diversas vezes pode soar exagerada para os dias atuais, mas lembra muito a interpretação de atrizes clássicas. Depois de viver a dor da perda do bebê, o casal tenta novamente e ela conta ao marido que está grávida. Tudo corria dentro da normalidade, até que uma forte dor a deixa em desespero. A dor é semelhante a que sentiu quando perdeu o primeiro bebê. A cena é conduzida pelo diretor Derek Cianfrance de tal forma que os atores estão totalmente entregues a dor de presenciar mais uma perda. Isabel grita para Tom: "Está muito cedo! Salva ele!". Tom agarra os braços da esposa atordoado e diz: "O que posso fazer. O que posso fazer!". A descrição da cena nos remete novamente ao tom do cinema clássico. 

O casamento do casal não tem mais o brilho de antigamente e distante do marido Isabel sente a perda dos bebês. O close no rosto da atriz ao se aproximar da grama onde estão as lápides dos filhos, logo me fez lembrar de Scarlet em diversos momentos de ...E o Vento Levou lamentando os sofrimentos vividos. Neste momento Tom avista um barco e alerta a esposa. Isabel vai ao encontro do marido porque escuta o choro de um bebê. A trilha sonora acompanha os sentimentos da personagem em um crescente pela descoberta da vida que surge. Lembre-se nos filmes clássicos quando algo de importância considerável para os personagens acontecia, a trilha sonora enfatizava ainda mais os sentimentos dos protagonistas? 

Quatro anos se passam e no meio do segundo ato da narrativa, a personagem Hannah entra no contexto como uma mãe sofrida que perdeu o marido e o filho em pleno mar. Pense nas quase quatro horas de ...E o Vento Levou. Imagine que Rachel Weisz entra na trama justamente para intensificar ainda mais o sofrimento dos protagonistas, pois ela é a mãe do bebê que o casal criou durante este tempo. E como no clássico, a cada cena, a intensidade da dor de mais uma personagem só aumenta juntamente com a duração do filme. 


No terceiro ato, o conflito toma conta da consciência do casal. Tom decide mandar pistas para Hannah em forma de cartas e objetos, como um sinal de que sua filha está viva e salva. A chegada da personagem quebra a ligação do espectador com o casal e o filme se estende por mais uma hora explorando o contexto da personagem. Para justificar um ato que Tom teve para ficar com a criança sem levantar suspeitas, a história e o romance de Anna ganham destaque em forma de flashbacks. O que poderia ser somente mencionado estende consideravelmente o filme. Como nas narrativas clássicas, quando o espectador está imerso na zona de conforto, mais dramaticidade é inserida na trama. Cabe ao belo trabalho de Rachel compreender que Hannah tem uma dor contida, talvez anestesiada por tamanho sofrimento. Aqui a atriz tira um pouco do tom dramático existente em A Luz entre Oceanos. Quando Isabel precisa entregar a criança para a mãe biológica, Alicia é amparada por um personagem enquanto cai lentamente sem forças no chão. Quantas vezes vimos essa cena em filmes clássicos?

Se Rachel proporciona ao espectador um alívio para a dramaticidade do casal , ao mesmo tempo é o arco da personagem que faz o filme estender consideravelmente sem saber que hora deve parar. Ao explorar a falta de conexão da criança com a nova família, a trama perde o ritmo e demora para reencontrar um caminho no desfecho tão esperado pelo espectador. No final do terceiro ato, o término do filme é extremamente piegas, mas faz jus ao cinema clássico Hollywoodiano em uma bela homenagem. 

Comentários

Anônimo disse…
Adorável, tua escrita.
Paula Biasi disse…
Este comentário foi removido pelo autor.

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