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A paixão pela sétima arte (Pulp Fiction)


Quentin Tarantino chamou atenção em Cães de Aluguel, mas foi com Pulp Fiction que o diretor conquistou a fama. O filme ganhou vários prêmios em festivais pela forma como Quentin decidiu apresentar a trama de dois assassinos profissionais. O filme sim é um deleite para o espectador que observa a competência na direção e roteiro do estreiante. A dupla interpretada por Samuel e John esbanja carisma e química, porém o melhor de tudo é que cada personagem que entra na trama ganha igualmente a atenção do espectador,  assim o público fica imerso ao longo de toda a narrativa.

Um dos elementos narrativos que faz de Pulp Fiction um filme diferenciado é a edição.  O espectador acompanha o filme sem ter a noção de que o terceiro ato na realidade trata-se do começo. A edição conduzir de tal forma a trama que da maneira como ela é apresentada ao espectador dá para perceber tranquilamente que o filme segue um fluxo linear. Quando o personagem de John Travolta morre é o plot twist  de que a narrativa não segue a linearidade dos fatos em si. Como ele morre e a trama ainda continua com a presença  do ator, o espectador percebe que a edição possui um papel fundamental no filme como um todo. Claro, tudo explorado de forma redonda pelo roteiro do diretor. Outro elemento primoroso no longa e que segue constante na filmografia de Tarantino é a trilha sonora. Cada personagem possui uma trilha específica. O destaque fica para Uma Thurman, que além de dançar em um concurso com Travolta, ainda tem uma cena exclusiva para uma apresentação solo embalada pela música Girl You Be a Woman Soon, de Urge Overkill. O filme poderia tornar-se cansativo pela entrada constante de personagens na trama e por ser em "capítulos" finalizados pelo feed out, mas a trilha proporciona ritmo ao filme.


O que torna Pulp Fiction especial na filmografia de Tarantino e o que marcou o diretor ao longo da carreira é que além da segurança ao conduzir a narrativa, Quentin sabe dirigir como poucos o elenco. A primeira cena com Ringo e Yolanda na cafeteria demonstra a firmeza do diretor em explorar o máximo dos atores. Todos os personagens contribuem para a trama. Uma Thurman reforça o tom de ameaça que permeia os atos pelo fato da personagem ser mulher de Wallace, além, é claro, da tensão amorosa entre Mia e Vincent. Bruce Willis apresenta um lutador com o arco mais desenvolvido dos coadjuvantes. O ator tenta fugir do estereótipo dos filmes de ação de forma mais introspectiva. John Travolta está bem como Vicent e a química com Samuel funciona durante boa parte do longa, mas é nítido que Tarantino faz de Jules o ponto chave para a edição ganhar protagonismo na narrativa. A presença do ator é marcante durante os atos e a forma como Jules consegue manter a calma e apresentar um tom ameaçador marca não somente o personagem como também prende a atenção do espectador até o desfecho do filme. 

A direção de Quentin Tarantino explora ao máximo o close de Jules e Vicente nos momentos mais tensos da narrativa. É interessante perceber como o diretor posiciona os atores em cena na mise-en-scène e como Tarantino busca dar ênfase no término de uma cena para um coadjuvante que estava quase desapercebido mostrando total domínio ao explorar cada detalhe. E como o diretor cria a atmosfera? É neste quesito que o roteiro sobressai. À medida que os personagens estabelecem diálogos  intermináveis sobre comida, religião e em alguns momentos o perigo iminente de Wallace, Quentin aos poucos cria um atmosfera tensa para que a violência venha à tona.O que faz Pulp Fiction ser um atemporal? A trama simples de dois assassinos é contada por um diretor apaixonado pela sétima arte e este aspecto faz toda a diferença. 

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