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Seria a escolha do espectador ? (O Preço da Verdade - Dark Waters)


O Preço da Verdade - Dark Waters é uma cinebiografia que aborda a trajetória do advogado Robert Bilott. Após conseguir estabilidade profissional, um possível cliente o procura para denunciar a suspeita de material tóxico em fazendas. Wilbur Tennant o entrega várias fitas VHS contendo evidências claras de que o gado foi atingido pela substância. A morte de cento e noventa animais faz Wilbur agir por desespero. O protagonista não vê muita relevância no caso, porém. tudo ganha drásticas proporções à medida que Robert começa a coletar provas e fazer descobertas preocupantes. Dupont é a empresa que está envolvida nas mortes dos animais de Wilbur e, além das mortes, Robert descobre que a empresa está envenenando intencionalmente mais de setenta mil moradores da região por décadas.

O roteiro consegue abordar a premissa de forma satisfatória e transmite para o espectador toda a angústia da luta entre Davi e Golias, a Dupont é uma empresa milionária que possui todos os recursos para pressionar autoridades e frear todas as ações e descobertas de Robert. O roteiro explora de forma detalhada todos os passos do protagonista para levar às autoridades a verdade. Existe um equilíbrio entre a batalha do pequeno advogado contra a empresa. O protagonista luta até os dias atuais nos tribunais para indenizar as famílias prejudicadas. Quando Robert descobre que o material está presente na água da população, o caso ganha uma reviravolta que prende ainda mais o espectador. O roteiro ressalta de forma intensa as consequências do caso na vida pessoal e profissional dos envolvidos. Famílias que forneceram informações para o protagonista são hostilizadas e marginalizadas. O destaque coadjuvante fica para o arco do fazendeiro Wilbur Tennant. O personagem move boa parte da trama e intensifica o drama presente na narrativa. O núcleo familiar que parece ser coadjuvante no primeiro ato torna-se protagonista à medida que Robert descobre que a família também é vítima da empresa. Sarah fica em segundo plano, pois é retratada como a esposa e cristã devota, apesar de em uma única fala o roteiro deixar claro para o espectador que ela exerce um papel fundamental na vida do marido. 


A presença de Mark Ruffalo como Robert Billot é marcante e faz o espectador ter empatia pelo sofrimento do protagonista. Mark parece uma bomba relógio prestes a explodir ao mesmo tempo em que mantém todos os sentimentos aprisionados dentro de si. À medida que a tensão aumenta Mark intensifica características e postura corporal de Robert. Existe um trabalho minucioso ao compor o personagem que pode ser observado no olhar e principalmente na forma como o ator projeta os lábios. São detalhes que fazem a diferença no amadurecimento de Mark como ator. Já Bill Camp demonstra a firmeza necessária para que Wilbur tenha força na trama. Nos piores momentos o personagem permanece firme e alerta o protagonista sobre não acreditar no sistema. As melhores cenas de Mark são com Bill. A dupla funciona de forma intensa para prender o espectador. Os demais atores são peças que auxiliam na trama, porém, não ressalta de forma significativa o arco dos coadjuvantes. 

Vale destacar os elementos narrativos no longa, em especial, a trilha sonora, fotografia e montagem. A trilha está presente durante boa parte da narrativa e acompanha o protagonista em momentos decisivos. É interessante analisar como a tensão é trabalhada pela presença do elemento narrativo. A trilha ganha sons pesados quando Robert sofre com os acontecimentos e o rumo das decisões tomadas pelo protagonista. A fotografia também dialoga com a tensão da narrativa. Sempre que Mark e Bill contracenam as cores frias ganham a tela. O drama é mais intenso quando os personagens estão em cena. Já a paleta de cores quentes é voltada para as reuniões com Tim Robberts e o núcleo familiar com Anne Hathaway. Agora, o destaque principal fica por conta da montagem em detalhar e ambientar o espectador na linha temporal do caso. Como o processo ainda está em julgamento, o elemento narrativo é de fundamental importância para situar o espectador nos acontecimentos. Em uma cena específica que Robert conta os detalhes da descoberta para a esposa, o trabalho da montagem fica evidente e torna a cena dinâmica. Porém, o elemento narrativo não evita que o filme por vezes se torne cansativo. O Preço da Verdade - Dark Waters é um filme necessário, mas ele seria a escolha de um espectador que possui blockbusters em cada sala como concorrente? 

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