Sylvester Stallone ainda é o tipo de ator em Hollywood que leva o público aos cinemas. Os tempos são outros e os serviços de streaming fazem o espectador pensar duas vezes antes de sair de casa para ver determinado filme. Mas com Stallone existe um fator além da força em torno do nome e que atualmente move a indústria: a nostalgia. Rambo carregava consigo traumas da Guerra do Vietnã e foi um sucesso de bilheteria. Os filmes de ação tomaram conta dos cinemas e consagraram de vez o ator no gênero. Quatro décadas após a estreia do primeiro filme, Stallone resgata o personagem em Rambo: Até o Fim.
Na trama Rambo vive uma vida pacata no Arizona. Domar cavalos e auxiliar no trabalho da policial local é o que mantém Rambo longe de certos traumas do passado. Apesar de tomar remédios contralodos, a vida beira a rotina. O roteiro de Stallone prioriza o arco de Gabriela, uma jovem mexicana que foi abandona pelo pai e que vê no protagonista uma figura paterna. No momento em que Gabriela decide cruzar a fronteira e conhecer seu pai, a tranquilidade de Rambo acaba. Stallone aborda assuntos pertinentes, mas de maneira rasa e praticamente monossilábica. O que dialoga perfeitamente com a essência de Rambo. O personagem nunca foi muito aberto ao diálogo e sempre viveu enclausurado nos traumas do passado. A questão é não desenvolver os demais personagens e a justificativa para a morte de Gabriela é simplesmente para ter ação e sangue nas telas. Mas essa não é a essência do protagonista? Rambo não é uma máquina programada para matar? Sim, a violência sempre foi a marca registrada da franquia, a questão é o roteiro fraco que justifique essa violência. No núcleo mexicano o roteiro permanece igualmente raso. Gabriela encontra o pai que fala meia dúzia de palavras e não aparece mais na trama. O arco dos irmãos mexicanos é substituído pelo sangue. Não sabemos muito sobre os personagens, o que prejudica o filme como um todo, pois os mexicanos são os vilões no novo capítulo da vida de Rambo.
Rambo é um marco dos filmes de ação nos anos oitenta e a todo o momento durante o filme uma pergunta martelava na minha cabeça: os equívocos que vejo aqui eram marcas nos filmes do gêneros na década de oitenta? O pouco desenvolvimento no arco dos personagens, muitos cortes e cenas aceleradas para impor ritmo. Tudo estava lá. Se a intenção era provocar um retorno ao passado, o filme estava no caminho certo. Nos diálogos rasos eu realmente me senti nos anos oitenta em mais um capítulo da franquia. O problema realmente foi a direção de Adrian Grunberg. Existem os sucessivos cortes e muito close nos atores, porém a câmera na mão e a proposta em acelerar a ação torna a mise-en-scène extremamente confusa. Em determinados momentos o espectador não consegue acompanhar as ações dos atores em cena. A junção da câmera de Adrian com a montagem proporciona uma sensação de desorganização no trato das cenas. Os cortes secos prejudicam ainda mais o trabalho do diretor. Não tive dúvidas: os elementos narativos afastam o espectador da nostalgia dos anos oitenta.
O que realmente me fez relembrar a franquia foi Sylvester Stallone. É muito sensível e bonito de ver o carinho que o ator tem pelo personagem. O fato de Rambo trocar a faixa vermelha pelo chapeu diz muito sobre a adaptação do protagonista. Rambo nunca conseguiu se desprender do passado e uma simples troca diz muito sobre o desenvolvimento do personagem. Stallone faz com que as imagens proporcionem um arco para o protagonista. Em alguns momentos Rambo toma remédios controlados. Não há necessidade de diálogos para o espectador notar com um cena que o protagonista ainda vive os traumas do passado. Stallone mescla um olhar cansado e certa ternura em acreditar que ainda existe bondade no mundo. Os demais atores fazem o que podem com a falta de desenvolvimento do roteiro. Como o espectador pode criar laços afetivos com Gabriela se não existe se quer uma conexão com o pai da personagem? Somente colocar Miguel para trocar algumas frases de efeito com a filha não faz o espectador se importar com a morte da personagem. O núcleo mexicano tenta imprimir ritmo ao filme, mas o que é explorado são os estereótipos nos trabalhos de Óscar Jaenada e Sergio Peris- Mencheta.Tudo é extremamente jogado no roteiro e os atores não conseguem fazer muito com que o tem em mãos.
A nostalgia está em alta na sétima arte e a intenção é explorar ao máximo os personagens marcantes no imaginário do espectador. É o que acontece com Rambo, que de tempos em tempos Stallone resgata para resignificar o elo entre o personagem e espectador. Não existe roteiro para um novo capítulo do protagonista. Os personagens são soltos na trama somente para justificar a sede de vingança do personagem. O filme vale pelo carinho que Stallone tem em desenvolver o personagem pelas imagens e pela morte final. Essa morte me transportou imediatamente para os anos oitenta. Se Rambo mata uma pessoa com arco e flecha e ela simplesmente desaparece, o protagonista pode matar um dos personagens da forma mais gráfica possível. Acredito que este seja o capítulo final de uma franquia onde o protagonista deixa definitivamente a faixa vermelha de lado para enfim utilizar o chapeu e cavalgar sem destino.
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