Os protagonistas se encontram em uma boate onde Alain trabalha
como segurança e separa ocasionalmente uma briga em que Stéphanie está
envolvida. Ele a leva para a casa e ambos trocam números para um possível
contato. Uma tragédia ocorre no trabalho da protagonista e assim, mesmo sem uma
atração existente, eles começam a se encontrar em determinados momentos
marcados pela ausência que um sente do outro. Alain não vislumbra outra ocupação,
mas sabe que pode ganhar mais dinheiro lutando. Um alimenta a necessidade do
outro, nos momentos em que ambos querem se reencontrar utilizam um código,
"OPÉ", uma simples desculpa que mais parece um novo recomeço para o
casal.
Alain tem um filho e não sabe como demonstrar seus sentimentos, a
única maneira que encontra é a brutalidade. A violência é marca registrada, ele
consegue extravasar sua raiva nas lutas e encontra aos poucos, na figura de
Stéphanie, um motivo para expressar laços de ternura adormecidos. Jaques
Audiard também produz e assina o roteiro. É claro o objetivo do diretor: fazer
o espectador sentir todo o sofrimento dos envolvidos com poucas palavras. Um
das cenas mais tocantes do filme, o lutador intensifica seus sentimentos com
apenas duas frases. "Não me deixa" e "Eu te amo". Assim, de
forma extremamente seca e objetiva, por telefone, não existe contato físico
para carregar na dramaticidade da cena. Não há necessidade, neste momento, o
espectador já está completamente imenso na dor dos envolvidos.
A dor contida os acompanha durante todo o filme. O diretor em
diversos momentos enfatiza com cortes abruptos a intensidade do sofrimento de
ambos e também prolonga as cenas se necessário. Quando a protagonista toma
conta da gravidade de sua situação, o momento é tocante , não dura muito,
somente o necessário para que o espectador sinta junto com a personagem que
aquele sentimento é extravasado, ele continua presente, mas é suavizado quando
ela se sente livre ao nadar no mar ou em uma simples dança. Jaques tinha em
suas mãos um roteiro que poderia facilmente carregar no melodrama, mas aqui
cada cena fala por si, sem a necessidade de diálogos imensos que só fariam
apelar para o sentimentalismo do espectador. Somos tocados com o pouco que é
mostrado, seja quando a personagem visita seus antigos companheiros de trabalho
ou se aproxima novamente das orcas, uma cena em que predomina o silêncio. Um
silêncio sábio e que diz muito.
Ferrugem e Osso não é um filme comum, apesar de aparentar e trazer
consigo os elementos que nos faz pensar de maneira simplória sobre ele. A dor
está presente em todos os momentos, ela nunca deixa o espectador. Os
sentimentos demonstrados de forma equivocada, ao final transbordam a
sensibilidade adormecida que precisava vir à tona. E a melhor maneira é fazer o
espectador ser refém dela.
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