Pular para o conteúdo principal

Imagens X Montagem (O Protocolo de Auschwitz)



Filmes de guerra provocam a imersão do espectador por colocá-lo dentro da narrativa. Em determinados longas, o público acompanha em tempo real todo arco do protagonista. Foi o caso de 1917, onde o espectador embarca na missão de Schofield. Já em A Lista de Schindler, Spilberg adota uma narrativa clássica com o ritmo cadenciado. Nele o diretor ressalta a trajetória de Oskar e a lista que salvou muitos judeus da Alemanha nazista. Seja qual for a forma explorada, o conteúdo voltado para a Segunda Guerra Mundial, especificamente, o nazismo, nos transporta para os fatos marcantes da época. Em O Protocolo de Auschwitz, a trama gira em torno do arco de Freddy e Kozlowski, dois jovens que conseguem fugir do campo de concentração nazista para relatar os horrores sofridos nesse período tão trágico da história mundial. 

O indicado da Eslováquia ao Oscar 2021 aproxima-se da narrativa dos demais filmes mencionados, pois destaca o arco de dois jovens e provoca imersão imediata ao explorar os momentos decisivos na vida de Freddy e Kozlowski. O diretor Peter Bebjak ressalta a câmera tremida e não desvia o olhar dos jovens. Peter segue todos os passos dos protagonistas alternando os planos e explorando ao máximo a câmera subjetiva para justamente provocar a imersão do espectador. Quando kozlowski sucumbe à exaustão, a câmera cai junto com o protagonista. Quando os jovens atores precisam ficar presos em c para tentar escapar Peter intensifica a atmosfera claustrofóbica com planos fechados e close. Existe um certo exagero ao exaltar os passos dos personagens com o excesso de informação na mise-en-scène. Esse excesso, no primeiro momento,  intensifica o caos pela sobrevivência, porém, quando utilizado em diversas cenas torna a narrativa cansativa.
 
 

O papel de Peter é fundamental, pois o foco do roteiro não é o desenvolvimento dos protagonistas, e, sim, destacar a força das imagens no campo de concentração e na fuga. Corpos empilhados, homens famintos morrendo de frio, tortura e a luta pela sobrevivência. As imagens ganham força e destacam o período de onze dias dos protagonistas ao tentar fugir com o objetivo principal de denunciar que o auxílio para os judeus e aos demais não estava chegando como era relatado pelos alemães. Além da direção, a fotografia também auxilia no arco dos personagens. A paleta com cores quentes é explorada principalmente nas cenas em que os protagonistas estão presos e escondidos. Já a paleta com cores frias destaca o sofrimento e evidencia os pesadelos de Kozlowski.

Vale destacar que ao mesmo tempo que a montagem é responsável por organizar o poder das imagens para auxiliar na imersão do espectador, ela prejudica de forma considerável o arco dos protagonistas. Alguns cortes são deslocados e abruptos prejudicando o ritmo como um todo. O caos apresentado na atmosfera do longa na fuga dos protagonistas fica perdido em meio aos inúmeros cortes até os protagonistas chegarem ao local esperado para relatar os acontecimentos. Temos uma batalha de elementos narrativos em cena durante todo o longa. De um lado, o poder das imagens de Peter. Do outro, a montagem que torna o ritmo confuso prejudicando o imersão do espectador. Independente dos tropeços narrativos, nunca é demais que novos filmes ganhem vida para retratar um período que persiste de forma camuflada nos dias atuais. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

E o atendente da locadora?

Tenho notado algo diferenciado na forma como consumimos algum tipo de arte. Somos reflexo do nosso tempo? Acredito que sim. As mudanças não surgem justamente da inquietação em questionar algo que nos provoca? A resposta? Tenho minhas dúvidas. Nunca imaginei que poderia assistir e consumir algum produto em uma velocidade que não fosse a concebida pelo autor. A famosa relíquia dos tempos primórdios, a fita VHS, também nos aproximava de um futuro distópico, pelo menos eu tinha a sensação de uma certa distopia. Você alugava um filme e depois de assistir por completo, a opção de retornar para a cena que mais gostava era viável. E a frustração de ter voltado demais? E de não achar o ponto exato? E o receio de estragar a fita e ter que pagar outra para o dono da locadora? Achar a cena certinha era uma conquista e tanto. E o tempo...bom, o tempo passou e chegamos ao DVD. Melhoras significativas: som, imagem e, pasmem, eu poderia escolher a cena que mais gostava, ou adiantar as que não apreciav...

Não, não é uma crítica (Coringa : Delírio a Dois)

Ok, o título estampado no cartaz é: Coringa: delírio a dois. Podemos criar expectativas que a continuação é um filme do Coringa, correto? Na realidade, o que Todd Phillips nos apresenta e faz questão de reforçar a cada cena é que temos o Coringa, porém, o protagonista é Arthur Fleck, um homem quebrado físicamente e mentalmente. Temos também Lee Quinzel, que projeta no outro um sentido na vida e começa a manipular Arthur, para que Arlequina venha à tona. Podemos refletir sobre a manipulação da personagem, ela inclusive reforça:"Não assisti ao filme vinte vezes, talvez umas quatro ou cinco. Quem não mente?". Mas dizer que ela é culpada pelas atitudes de Arthur/ Coringa? A coerência existe no fato da personagem possuir um transtorno mental e, por isso, justifica o desejo e manipulação. Agora, qual a necessidade de criar uma pauta inexistente? O grande equívoco talvez seja do próprio estúdio em não vender o filme como musical e gerar expectativas equivocadas no espectador. É um f...

Uma provável franquia (Histórias Assustadoras para Contar no Escuro)

Um grupo de amigos que reforça todos os estereótipos possíveis, a curiosidade que destaca os laços da amizade, uma lenda sobre uma casa assombrada e desaparecimentos constantes. Histórias Assustadoras para Contar no Escuro apresenta uma trama previsível repleta de referências à filmes  e séries lançadas recentemente como It: A Coisa e Stranger Things. É a velha cartilha de Hollywood: se deu bilheteria em um estúdio à tendência é repetir a dose. Apesar dos elementos e trama repetitivos, sempre vale a pena assistir novos atores surgindo e diretores principiantes com vontade de mostrar trabalho. É o que acontece neste filme produzido e roteirizado por Guilhermo Del Toro . Nada de muito inovador no gênero, o jumpscare reina, porém com o olhar criativo da direção e uma nova geração afiada, o filme ganha o envolvimento do espectador.  O roteiro gira em torno de um grupo de amigos excluídos que finalmente tomam coragem para enfrentarem os garotos mais valentes. Assustados, o ...