Pular para o conteúdo principal

Uma narrativa cômica (A Possessão de Mary)



Podemos esperar algo interessante de uma premissa já conhecida do espectador? Claro, se os elementos narrativos forem trabalhados de forma coerente e criativa, sempre vale a pena assistir algo que em um primeiro momento pode sugerir previsibilidade. O gênero ganhou força justamente por se reinventar. Filmes de possessão existem aos montes, praticamente todo ano estreia um voltado para essa temática. A Possessão de Mary é o filme da vez que abraça a premissa e consegue alcançar um único objetivo: fazer rir.

Na trama Gary Oldman vive David que simplesmente sente uma atração inexplicável por um barco e decide comprá-lo para investir em algo pensando no futuro da família. Com essas palavras ele justifica a compra para a esposa Sarah. E assim, o roteiro é repleto de frases soltas que convergem para a falta de desenvolvimento do arco dos personagens. Não bastasse a falta de coerência entre as ações que movem a trama e a maldição instaurada no barco, personagens retornam somente para gerar conflitos desnecessários. É o caso de Tommy que volta somente para mover o arco de Lindsey. Se a protagonista fosse mãe somente da pequena Mary faria mais sentido. Entre gritos e previsibilidade, o roteiro explora  com o auxilio da montagem o arco de Lydia, uma policial que interroga Sarah e que contribui e muito para a repetição de diálogos. A origem da maldição é apresentada de forma expositiva gerando uma tensão desnecessária entre Sarah e David. 


Os atores fazem o que podem com o roteiro e respectivos personagens. Gary Oldman grita a todo o momento que "não quer mais saber da maldição", a frase pode ser facilmente substituída por: "O que eu estou fazendo aqui?", enquanto Emily Mortimer se desespera com o comportamento da filha caçula, além do espectador ficar sabendo que a personagem era infiel ao marido. Cabe à atriz explorar o drama de Sarah que logo é deixado de lado para focar no que realmente importa na trama. Manuel Garcia-Rulfo é o que mais gera risos no espectador. Caricato e com um olhar penetrante, Mike é o braço direito de David e nas horas vagas flerta com Sarah até surtar quando o espírito de uma mãe perturbada invade o seu corpo. 

Tudo piora com a direção de Michael Goi que quer mostrar serviço com enquadramentos equivocados. Logo na primeira cena Sarah é interrogada e para "criar uma atmosfera tensa" o diretor explora ângulos e closes que reforçam o péssimo roteiro. A previsibilidade caminha com a direção que não consegue em momento algum sugerir a tensão que as cenas necessitam. Com o combo completo rumo ao total fracasso o filme somente consegue gerar risos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

E o atendente da locadora?

Tenho notado algo diferenciado na forma como consumimos algum tipo de arte. Somos reflexo do nosso tempo? Acredito que sim. As mudanças não surgem justamente da inquietação em questionar algo que nos provoca? A resposta? Tenho minhas dúvidas. Nunca imaginei que poderia assistir e consumir algum produto em uma velocidade que não fosse a concebida pelo autor. A famosa relíquia dos tempos primórdios, a fita VHS, também nos aproximava de um futuro distópico, pelo menos eu tinha a sensação de uma certa distopia. Você alugava um filme e depois de assistir por completo, a opção de retornar para a cena que mais gostava era viável. E a frustração de ter voltado demais? E de não achar o ponto exato? E o receio de estragar a fita e ter que pagar outra para o dono da locadora? Achar a cena certinha era uma conquista e tanto. E o tempo...bom, o tempo passou e chegamos ao DVD. Melhoras significativas: som, imagem e, pasmem, eu poderia escolher a cena que mais gostava, ou adiantar as que não apreciav...

Não, não é uma crítica (Coringa : Delírio a Dois)

Ok, o título estampado no cartaz é: Coringa: delírio a dois. Podemos criar expectativas que a continuação é um filme do Coringa, correto? Na realidade, o que Todd Phillips nos apresenta e faz questão de reforçar a cada cena é que temos o Coringa, porém, o protagonista é Arthur Fleck, um homem quebrado físicamente e mentalmente. Temos também Lee Quinzel, que projeta no outro um sentido na vida e começa a manipular Arthur, para que Arlequina venha à tona. Podemos refletir sobre a manipulação da personagem, ela inclusive reforça:"Não assisti ao filme vinte vezes, talvez umas quatro ou cinco. Quem não mente?". Mas dizer que ela é culpada pelas atitudes de Arthur/ Coringa? A coerência existe no fato da personagem possuir um transtorno mental e, por isso, justifica o desejo e manipulação. Agora, qual a necessidade de criar uma pauta inexistente? O grande equívoco talvez seja do próprio estúdio em não vender o filme como musical e gerar expectativas equivocadas no espectador. É um f...

Uma provável franquia (Histórias Assustadoras para Contar no Escuro)

Um grupo de amigos que reforça todos os estereótipos possíveis, a curiosidade que destaca os laços da amizade, uma lenda sobre uma casa assombrada e desaparecimentos constantes. Histórias Assustadoras para Contar no Escuro apresenta uma trama previsível repleta de referências à filmes  e séries lançadas recentemente como It: A Coisa e Stranger Things. É a velha cartilha de Hollywood: se deu bilheteria em um estúdio à tendência é repetir a dose. Apesar dos elementos e trama repetitivos, sempre vale a pena assistir novos atores surgindo e diretores principiantes com vontade de mostrar trabalho. É o que acontece neste filme produzido e roteirizado por Guilhermo Del Toro . Nada de muito inovador no gênero, o jumpscare reina, porém com o olhar criativo da direção e uma nova geração afiada, o filme ganha o envolvimento do espectador.  O roteiro gira em torno de um grupo de amigos excluídos que finalmente tomam coragem para enfrentarem os garotos mais valentes. Assustados, o ...