Os traços da turminha mudaram ao longo dos anos, mas a conexão com os leitores dos quadrinhos permaneceu forte. Várias décadas após a sólida relação estabelecida entre leitores e os personagens da turma da Mônica, eis que o quarteto principal chega aos cinemas. O filme possui uma vertente inocente para agradar o público infantil, porém, a nostalgia embala os adultos. Na trama, floquinho some e a turma decide trazer o cachorrinho de volta. No meio do caminho o quarteto enfrenta desafios e resgata o sentido verdadeiro da amizade.
O principal aspecto que move a trama e que reforça a nostalgia dos quadrinhos é o protagonismo do quarteto com relação aos adultos. Quando os amigos decidem seguir um plano infalível do Cebolinha para encontrar floquinho e não retornam para casa, os adultos ganham destaque como coadjuvantes. As participações especiais dos personagens lembram as revistinhas antigas quando os rostos dos adultos eram cortados das páginas e somente o corpo ficava em evidência. Geralmente a mãe chamava para comer ou alertar que já estava tarde para as brincadeiras. Lembro como se fosse hoje do dilema eterno da mãe do Cascão para que ele tomasse banho. A essência dos quadrinhos foi mantida no roteiro. No filme o protagonismo da turma é a chave para envolver o espectador. Palavras como gordinha e dentuça logo remetem a uma nostalgia cativante. Os planos de Cebolinha reforçam os traços antigos de Maurício de Souza. Enquanto Cebolinha elabora um plano que obviamente terá consequências, o espectador observa uma linda homenagem ao criador dos personagens. Magali como sempre comendo tudo que vê pela frente, inclusive a famosa melancia. Cascão sofre na pele com os planos de Cebolinha enquanto foge da água. Todas as características do quarteto são exploradas no roteiro. A essência dos personagens é a alma do filme.
Além do roteiro que capta a essência dos personagens e inocência da turminha, o figurino tem um papel fundamental ao resgatar o imaginário dos leitores. O cuidado com a caracterização dos personagens agrada em cheio o espectador que cresceu lendo os gibis da Mônica. É na simplicidade e nas cores que cada personagem ganha vida na tela. Cebolinha com a blusa verde; Cascão com o suspensório vermelho; a Mônica com um vestidinho vermelho e a Magali com vestidinho amarelo. O cuidado com a caracterização dos adultos também é ressaltado na trama. As figuras maternas são os destaques. A fidelidade com os quadrinhos impressiona. Um cuidado necessário para estabelecer o elo entre os leitores mais nostálgicos dos gibis. Já a trilha exerce fundamental importância na aventura do quarteto. A presença constante do elemento narrativo move os amigos e proporciona ritmo ao filme. Nos momentos de tensão a trilha é fundamental para criar uma atmosfera diferenciada na trama, especialmente no encontro de Cebolinha com o Louco. Assim como a trilha proporciona tensão, o som diegético também é de fundamental para a leveza do vilão. Ao ligar o rádio e começar a cantar, a música reforça uma camada diferenciada do personagem, uma bela junção de composição de personagem e som diegético.
Para que a adaptação funcionasse nas telas o quarteto precisaria possuir química em cena. Existe ao longo do filme a constante sensação de inexperiência dos atores mirins, muitos em seu primeiro trabalho para o cinema. O que é natural, mas torna-se evidente em cena. As pausas nos diálogos reforçam essa inexperiência, porém o filme não deixa de ter a força necessária para envolver o espectador. É complicado para os atores darem vida para personagens tão emblemáticos na cultura brasileira. Talvez em uma sequência o quarteto já esteja familiarizado com os personagens e a atuação ganhe mais ritmo. O destaque do quarteto é Gabriel Moreira. O ator é o mais solto e em sintonia com o personagem. No núcleo adulto o destaque fica por conta de Rodrigo Santoro e Ravel Cabral. Rodrigo em uma participação especial tem o cuidado de emprestar leveza ao personagem em um momento importante para Cebolinha. Apesar de estar escondido no trabalho competente da maquiagem, o ator transborda domínio em cena. Já o Homem do saco caiu como uma luva para Ravel. Fisicamente, o ator possui traços fortes e expressões intensas para compor a vilãnia do personagem, mas a cena em que ele canta é cômica e ao mesmo tempo mantém a inocência presente no filme.
Turma da Mônica - Laços acompanha o surgimento de um novo gênero nos cinemas é ganha o espectador pelo cuidado e detalhes em manter a essência dos quadrinhos nas telas. Daniel Rezende conduz a trama de forma envolvente, pois mescla inocência e amizade com um olhar terno e o cuidado que os personagens necessitam. O diretor consegue preservar o imaginário do público adulto e agradar também os mais novos. O diretor transforma cada personagem em protagonista. Cada um possui suas características e destaque dentro da trama. Daniel reforça as emoções dos personagens optando pelo plano detalhe no rosto dos atores reflexo da confiança do diretor ao apostar na naturalidade do quarteto. A inexperiência fica evidente em alguns momentos, mas o mais importante Daniel conseguiu manter durante todo o filme: a essência de cada personagem.
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