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Tudo é uma grande homenagem (O que fazemos nas sombras)


Viago, Vladislav, Deacon e Petyr. Quatro vampiros de idades distintas vivendo no mundo dos meros mortais. A proposta de O Que Fazemos Nas Sombras é apresentar ao espectador um pouco da vida dos vampiros com um documentário. Dois câmeras registram o cotidiano dos vampiros de forma realista. O ideal é transmitir com "naturalidade" para o espectador um pouco de como os quatro amigos, antes de serem vampiros, são basicamente no período noturno. Jemaine Clement e Taika Waititi são os donos do longa. A dupla está envolvida em basicamente todas as funções possíveis no filme. Os gêneros predominantes, o terror e a comédia, nos envolvem de tal maneira que o documentário passa rapidamente. 

A dupla presta uma homenagem aos monstros da sétima arte. O foco são os vampiros, mas entre os atos outros monstros surgem no documentário. O roteiro propõe ao espectador saber mais sobre os quatro amigos. Os arcos dos personagens são bem desenvolvidos e todos possuem a devida importância na trama. Petyr é o mais velho e carrega consigo a aura de Nosferatu, de Murnau. Uma bela referência ao clássico do Expressionismo Alemão. Viago é o anfitrião da casa que nutre uma paixão platônica por uma senhorinha solitária. Vladislav é o vampiro sedutor com porte de conde Drácula. O personagem possui uma reviravolta simples e ao mesmo tempo que dialoga perfeitamente com a sátira proposta no filme. Deacon é um jovem rebelde que vê sua juventude e posto ameçados pela presença de um novo vampiro. Nick entra para o grupo com o dilema de se acostumar com a nova vida de imortal. Não poder comer batatinhas é um drama para o personagem. Dessa forma, cada vampiro com sua personalidade marcante cativa por completo o espectador. O roteiro presta uma homenagem ao gênero sem deixar de lado a comédia. O tom de documentário, principalmente, no terceiro ato, nos remete imediatamente A Bruxa de Blair. 

As atuações são o destaque do documentário. Os quatro amigos ganham o espectador logo no primeiro ato com a apresentação de cada personagem. Taika Waititi compõe o protagonista de forma hilária e ao mesmo tempo introspectiva. Um tom de deboche ingênuo acompanha Viago durante todo o filme. A preocupação do vampiro em colocar ordem na casa e perceber que nenhuma delas será seguida, aumenta a ingenuidade de Viago. Praticamente uma criança no corpo de um adulto. Já Vladislavi é o oposto e realmente só quer saber de fazer vítimas e acredita que ainda consegue hipnotizar mortais. Jemaine brinca com o personagem forjando uma sedução canastra. Deacon é o rebelde sem causa aparente. Perder o posto de mais novo dos amigos não é tarefa fácil. Realmente é um dilema intenso. Vale não tentar rir na cena de dança sensual que ele faz para os amigos, na realidade o espectador que é agraciado com tanto charme e sedução. O grande objetivo dos atores é brincar com os estereótipos e com o gênero. Eles levam a construção dos personagens a sério, mas ao mesmo tempo estão obviamente se divertindo. O espectador percebe o jogo de diversão e seriedade, o que faz a homenagem ainda mais interessante.  


A proposta da direção é envolvente para o espectador, pois pode parecer em um primeiro momento despretenciosa e solta na brincadeira de Taika e Jemaine. Aos poucos o público percebe que a direção tem o propósito de descontrair, mas com precisão. As cenas proporcionam uma atmosfera próxima dos filmes de terror e ao mesmo tempo mescla o tradicional com o moderno. Ter um personagem próximo de Nosferatu e enfatizar a adaptação de Nick no melhor estilo crepúsculo reforça o total comprometimento com a descontração dos opostos. A sensação é de uma grande brincadeira com o foco principal na homenagem.

O Que Fazemos Nas Sombras é sinônimo de criatividade com poucos recursos. O que Taika e Jemaine realizam com o documentário é a junção de vários gêneros que envolvem de forma inusitada o espectador. A brincadeira explora romance, ação, drama, comédia e reviravoltas. Tudo transmite a sensação de um grande caos que remete ao passado e busca o futuro. Nosferatu e Crepúsculo. É um deboche sem tamanho, mas não se enganem... tudo é uma grande homenagem.

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