O segundo filme da trilogia das cores de Krzysztof Kieslowski, A Igualdade é Branca, nos envolve pela comédia. O enredo é focado no estudo de personagem do protagonista. O polonês Karol, com um bloqueio temporário sexual, não consegue satisfazer a esposa, Dominique, e ela pede o divórcio. Não somente o divórcio, Dominique briga judicialmente por todos os bens do casal. A personagem bloqueia todos os cartões do marido. Sem ter como voltar para a polônia e sem dinheiro, Karol conhece Mikolaj que o ajuda no retorno para casa. O retorno é muito agradável, pois o protagonista retorna dentro de uma mala. Aos trancos e barrancos, Karol chega e conhece de uma maneira nada amistosa um grupo de mafiosos e decide que quer "fazer negócios". Na realidade o que o protagonista almeja é a vingança contra a esposa.
O roteiro de Krzysztof explora ao máximo o arco de Karol dando ênfase na transição da fragilidade para a liderança e poder nos negócios. Karol é um ótimo cabelereiro, mas precisa conseguir dinheiro o mais rápido possível. No novo emprego, aos poucos o diretor demonstra a evolução do protagonista e o crescimento da aura em torno dele. No primeiro ato, um cabelereiro premiado. Nos demais, um homem extremamente inteligente que comanda o próprio negócio. É interessante perceber que mesmo motivado pela vingança, em nenhum momento o roteiro deixa de enfatizar que o casal ainda nutre sentimentos um pelo outro. É o equílibrio entre o amor e a busca pela vingança. Ao forjar a própria morte, Karol provoca o reencontro com Dominique. Acreditando que o marido está morto e desejando ficar com a herança, a protagonista leva um susto ao encontrar o marido vivo com um olhar diferenciado. O jogo entre personagens e a transformação de Karol movem a trama.
Assim como em A Liberdade É Azul, onde Juliette Binoche abraça a solidão da protagonista, em A Igualdade é Branca a trama também ganha força pela atuação de Zbigniew Zamachowshi. O ator compreende perfeitamente a transição e transformação de Karol. Mesmo mantendo a essência do protagonista que não consegue atirar em Mikolaj transmitindo ao espectador uma aura inocente, o ator muda a postura fisicamente. Karol no segundo ato ainda morre de medo por estar envolvido com pessoas perigosas, mas a vingança o transforma momentaneamente em uma pessoa mais determinada, também no quesito sexual. Zbigniew consegue transmitir no olhar a pureza e determinação de Karol. A fragilidade ainda persiste, mas a inteligência em administrar os negócios o torna mais confiante. O filme é todo de Zbigniew para Zbigniew.
Os elementos narrativos presentes em A Igualdade é Branca reforçam a transformação do personagem. No segundo ato, ainda amedrontado pela ameaça de alguns parceiros no novo trabalho, o figurino de Karol tem destaque para a cor branca. A partir do momento que a transformação do protagonista é completa, o figurino ganha tons mais escuros e sofisticados. O mesmo acontece com a paleta de cores que alterna uma fotografia quente e fria acompanhando o protagonista. Quando Karol volta para a Polônia, o frio toma conta junto com a frieza nas decisões do protagonista. No último encontro com Dominique a paleta é destaque pelas cores quentes intensificando a aproximação do casal.
A Igualdade é Branca é uma trama sobre a transformação do protagonista. Krzysztof explora com equilíbrio a transição entre a fragilidade e determinação de Karol. Acompanhar a trajetória do protagonista envolve o espectador e o desfecho é de uma leveza sem tamanho. O carinho que o casal nutre um pelo outro faz a vingança ficar pequena. O olhar terno do protagonista no última cena reforça que o carinho nunca deixou de existir, mas que era preciso sentir a transição motivada pela vingança para saber que a essência de Karol ainda estava presente. No duelo entre o amor e a vingança, quem realmente ganha é o espectador que observa um belo estudo de personagem.
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