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O poder da trilha e do som (Baby Driver)


Quando os elementos narrativos estão em sintonia dentro da trama algo importante acontece: a magia da sétima arte toma conta da tela e temos um filme diferenciado. Esses elementos elevam a narrativa e instantaneamente envolvem o espectador. É o caso de Em Ritmo de Fuga (título questionável para Baby Driver), o mais recente filme de Edgar Wright. Logo na primeira cena, o público é o passageiro especial dentro do carro do protagonista. O diretor insere o espectador na trama de forma impactante com o diálogo entre a mise -en-scène, trilha sonora e o som diegético. 

Baby Driver pode transmitir em um primeiro momento a sensação de ser uma narrativa calculada. O protagonista interage com a cidade que o cerca. As ruas, o desvio de pessoas nas calçadas, o café que sempre compra depois de um "serviço" e até no gestual que acompanha a arte na parede de um edifício. Todos os elementos cênicos dialogam com a trajetória dos personagens. Após o primeiro impacto causado pela movimentação do protagonista que pode soar coreografado ao extremo, o diretor logo ambienta o espectador na trama e alerta: o primeiro impacto já passou e tudo acontecerá durante a trama de forma conexa e orgânica.


Edgar Wright explora ao máximo o som diegético e a trilha sonora na narrativa. A movimentação cênica casa perfeitamente com o som dentro da trama. O que pode causar ruído no começo do primeiro ato acompanha o espectador é o envolve cada vez mais. A batida da porta do carro, o copo de café, o som diferenciado e abafado que acompanha o protagonista por um problema auditivo. A música e o protagonista são um só e as mudanças no arco do personagem auxiliam o espectador na compreensão dos dilemas vividos por Baby. Quando o protagonista se apaixona, as músicas são mais lentas, nas perseguições, elas são pulsantes. O caso mais enfático é a presença marcante de Bats vivido por Jamie Foxx. A trilha ganha outro contexto sempre que o personagem está em cena.


O diretor também escreve o roteiro que consegue equilibrar o tom entre a ação e o romance. Debora interpretada por Lily James transmite um ar inocente e leve para a personagem que contrasta com a violência presente na trama. O romance dos jovens no terceiro ato ganha uma atmosfera interessante de Bonnie e Clyde juvenil. O roteiro explora esse aspecto evidenciando o tom certeiro do humor na narrativa. Outro personagem importante no enredo é o pai adotivo de Baby que possui uma deficiência auditiva e proporciona ao filme em determinados momentos uma quebra de ritmo onde o silêncio ajuda na comunicação dos personagens. 

Baby Driver é um filme importante pela ligação dos elementos narrativos que proporcionam ritmo para a trama. Imagine Amnésia de Nolan sem o trabalho da edição. Seria mais um filme típico de suspense. Com esse elemento narrativo, o filme ganhou um status diferenciado. O mesmo acontece com o som em Baby Driver. Pensar no filme sem esse elemento significativo que movimenta a trama seria reduzir pela metade o sentido da narrativa, ele é em vários momentos o verdadeiro protagonista. Baby Driver explora os elementos narrativos de forma competente e proporciona ao espectador um equilíbrio interessante de tons de leveza presente no romance juvenil e a pulsão da violência nas cenas de ação, sempre com o auxilio de uma trilha sonora que embala os personagens e cativa o público em cada cena.



   


Comentários

Unknown disse…
A trilha sonora é uma peça perfeita para Em ritmo de fuga. Sou uma fiel seguidora de Edgar Wright. Apesar de não ser um diretor tão reconhecido na indústria do cine, ele é um dos poucos que conseguem boas obras cinematográficas de ação graças ao seu grande profissionalismo. Deve ser por ele que grandes atores como Ansel Elgort querem participar nos seus filmes. Baby Driver filme é o mais recente dos seus trabalhos, um filme que é uma referência do gênero. Seus efeitos especiais estão incríveis, trilha sonora e atuações geram um resultado que consegue captar aos espectadores. Vi este filme por que amo aos atores que participam nele.
Paula Biasi disse…
Tão bom quando um elemento narrativo move a trama. Que cuidado em casar a trilha com a edição.

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