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A autoria perde aos poucos a força (O filme da minha vida)


O Filme da Minha Vida foca no protagonista Tony que tenta lidar com a ausência do pai quando retorna para a cidade natal, Remanso, na Serra Gaúcha. Uma temática sensível e constante nos filmes de Selton Mello volta com menor pulsão na trama: os conflitos familiares. Nos filmes anteriores, Feliz Natal e O Palhaço, o diretor explorava a vertente melancólica ao retratar a vida dos personagens. O Filme da Minha Vida também ressalta essa questão, mas o terceiro ato provoca conflitos de ritmo e previsibilidade dentro da narrativa.

A narração de Tony durante os primeiros minutos ambienta o espectador e proporciona a trama um ar melancólico que irá acompanhar o protagonista durante todo o filme. O trabalho de composição de Johnny Massaro transmite todo o vazio em busca do amor paterno que sempre resgata de lembranças da infância. Aqui, o diretor foca em atores mais jovens e o resultado causa ruído nas interpretações. Johnny consegue segurar o protagonista de forma competente, mas alguns personagens coadjuvantes enfraquecem a narrativa pela falta de intensidade em cena. As irmãs Luna e Petra proporcionam belos planos fechados e closes , mas a ausência de segurança na atuação fica evidente.

Selton consegue trazer ao objeto cênico valores repletos de significados na vida dos personagens. O andar de bicicleta que transporta o protagonista imediatamente para saudosas recordações e laços afetivos, um globo terrestre que humaniza a prostituta e o trem que liga histórias dentro da trama. O diretor exalta com sensibilidade cada objeto enriquecendo a narrativa.




O roteiro equilibra momentos dramáticos com um humor leve presente no núcleo escolar. Selton demonstra sensibilidade ao explorar a naturalidade de atores mais jovens. O filme também ganha força e luz (literalmente) com a presença de Vincent Cassel. Alguns equívocos ficam evidentes principalmente no clímax do roteiro. Uma tempestade, o trem que entra na escuridão e a luz forte em Petra são soluções previsíveis tomadas pelo diretor.


Selton explora ao máximo os personagens com planos fechados e em determinados takes opta por centralizá-los. Os planos abertos são voltados para ressaltar a atmosfera da narrativa. A fotografia dialoga com o zoom in do diretor em cenas marcantes. Outro elemento narrativo importante no filme é a direção de arte que ambienta e transporta o espectador para a década de 1960. A trilha sonora, o figurino, carros e o dilema da transição do rádio para a televisão são aspectos que enriquecem a trama.

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