No filme de Todd Field a ausência de
Cate Blanchett é evidente e quem surge é Lydia Tár. A atriz literalmente deixa a protagonista tomar conta da narrativa. Poucas conseguem o que Cate realiza no longa. A composição da protagonista é similar a de uma partitura. A atriz apresenta nuances de forma linear, como a frieza e arrogância da protagonista, para, posteriormente, o espectador entrar na partitura por completo, quando Lydia perde o controle por conta da avalanche de comentários e manifestações que retratam a cultura do cancelamento.
A firmeza e entrega de Cate é intensa e contida por conta da frieza e forma como Tár trata todos ao seu redor. À medida que Cate perde o controle, a frieza ainda persiste ou seria arrogância? Talvez pelo fato de ter que enfrentar o preconceito em um meio dominado por homens e também por ser lésbica. O estudo é tamanho que pequenos detalhes, como dois toques no nariz, evidenciam o TOC que a protagonista tenta controlar entre um comprimido e outro até que tudo desmorona. Porém, quanto mais a atriz demonstrava a frieza de Tár nos atos, mais me distanciava da protagonista. Dediquei dois parágrafos da crítica para ressaltar a competência da atriz, porém, com a junção dos demais elementos narrativos, que ressaltam ainda mais o distanciamento de Tár dos personagens, me sentia como um deles, totalmente afastada da protagonista, com igual frieza.
Os elementos narrativos auxiliam na composição de Cate para o papel. O figurino mescla cores neutras e o preto. Existe um lenço em determinado momento, mas o figurino mantém cores frias. Outro destaque é o desing de produção que foca no perfeccionismo de Tár. A mansão demonstra como a personagem torna-se pequena perante os bens que conquistou. Já o apartamento em que a protagonista busca refúgio auxilia no flerte e reflete o caos e descontrole. O local é desorganizado e propositalmente iluminado. É o refúgio do caos da criação e do proibido.
A direção de Todd Field é precisa ao acompanhar os passos firmes de Tár. A câmera persegue Cate e também a sufoca. No primeiro ato, o contra- plongée destaca a grandiosidade da protagonista. Já o close prevê a falta de controle na cena posterior. Todd e Cate dialogam entre si para demonstrar o estudo de personagem de um dos melhores papéis da carreira da atriz. Enquanto Cate coleciona prêmios, a cada revisão de Tár, eu me distancio por completo de Lydia. A partitura não me tocou.
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