No filme sul-coerano Parasita os personagens vivem sugando uns aos outros. O diretor Bong Joon-ho demonstra habilidade ao enfatizar a todo o momento esse aspecto. Um suga o outro quando o jovem Ki-Woo começa a dar aulas de inglês para a filha de Yeon- Kyo. Não demora muito para o personagem planejar um emprego na casa para a irmã. No intuito de conseguirem uma vida melhor, os jovens seguem um plano para conseguirem empregos na casa para os pais. Ki-Jung planta uma prova para provocar a demissão do motorista. Ela tira sua calcinha e deixa no carro. Os patrões ricos pensam que o motorista utiliza o carro para outras questões e a demissão é imediata. Uma pausa na agência de veículos para compreender como funciona o carro e logo o pai é o novo motorista de Sr. Park. Agora só falta a mãe para que o plano saia perfeitamente como combinado. Ki-Jung sempre escutando a conversa dos patrões descobre que a governanta tem alergia a pêssegos. Inesperadamente, Moon- Gwang passa mal, não consegue trabalhar e é demitida pela dona da casa. Pronto, Chung- Sook assume o lugar de governanta na casa. Todos da família empregados sonhando com uma vida melhor. O plano não poderia falhar. Em certo momento da trama Ki- Taek fala para o filho em tom melancólico: " A vida é melhor sem planos". Essa frase demonstra certo arrependimento do patriarca ao colocar a família em risco modificando os rumos da trama.
O diretor responsável pelo roteiro evidência o jogo de interesses e explora o forte viés da desigualdade social. Bong Joon- ho explora ao máximo os paralelos entre os personagens. Os diálogos destacam o preconceito e o cheiro do personagem de Ki-Taek. Esse aspecto provoca uma reviravolta dentro da trama e modifica a atmosfera do filme. Até a metade do segundo ato a diferença de classes é sentida pelo espectador de forma cômica. Além da alternância de gêneros, o diretor explora perfeitamente o arco dos personagens e como cada um possui a devida importância para as reviravoltas sentidas na trama. O roteiro é extremamente certeiro ao explorar os conflitos internos dos personagens. Repleto de simbolismos a mise-en-scène contribui na riqueza de detalhes que o diretor a utiliza para explorar os sonhos e a dura realidade dos personagens. Ao posicionar a família pobre embaixo da mesa escondidos, Joon destaca que fisicamente a família está em um lugar melhor, mas ainda permanecem invisíveis na sociedade. Enquanto a família rica dorme no confortável sofá. Outro momento interessante presente no roteiro é quando o jovem Ki- Woo observa pela janela a festa de aniversário do caçula da família rica. Ele reflete se um dia irá pertencer aquele mundo. O fato de o personagem ver o mundo dos ricos com um obstáculo cria uma rima visual sentida logo no começo do filme. A família pobre sempre observa a vida pelo vidro pequeno de onde moram. O vidro pequeno é a realidade, a vida como ela é. Já a janela dos ricos é maior reforçando a ideia de um sonho inatingível. Dessa forma no decorrer dos atos, o diretor sempre destaca a desigualdade social entre as famílias.
O ritmo e a trilha sonora auxiliam na alternância de gêneros criando uma atmosfera de suspense na metade do segundo ato. O trabalho competente e inspirado de Jooh na direção também cria a atmosfera necessária nas reviravoltas que o roteiro sugere. Os enquadramentos fechados no porão da casa e a movimentação dos atores na mise-en-csène são fundamentais para que o espectador sinta a tensão presente no filme. Sempre que acontece algo em cena o diretor explora algum personagem ao fundo descendo ou subindo as escadas. Existe um domínio de Jooh em construir cada detalhe para que o espectador fique imerso na trama. O close reforça a presença de personagens fundamentais para as reviravoltas e camadas no arco dos personagens. O diretor conduz de forma precisa às cenas que exigem certo caos na atuação do elenco. Jooh transmite propositalmente a desordem na mise-en-scène causando impacto no público. A alternância de gêneros é fundamental para proporcionar ritmo ao filme para que no terceiro ato a sensibilidade prevaleça. Além da direção que destaca a todo o momento a desigualdade social, o design de produção reforça esse aspecto. A casa de Sr. Park é luxuosa e a iluminação faz toda a diferença ao provocar a sensibilidade do espectador. Já o cubículo de Ki -Taek é abafado e extremamente apertado.
A desigualdade social que move a trama é sentida pelo espectador por conta da entrega de todos os atores aos personagens. Cho Yeo- jeong é a mãe alienada e fútil que não consegue enxergar que está sendo perfeitamente enganada. A atriz é responsável por proporcionar leveza a trama. Mas é Kang- Ho Song que consegue transitar perfeitamente entre os gêneros sendo o destaque do elenco. A entrega do ator durante os atos nas cenas cômicas e dramáticas evidência a complexidade do personagem. Parasita foi o ganhador da Palma de Ouro no festival de Cannes e segue firme na corrida para o Oscar na categoria de filme internacional, mas além das premiações, o filme de Jooh-ho ganha verdadeiramente o espectador pela mensagem que provoca inúmeras reflexões.
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