Durante todo longa do diretor Carlos Lopez Estrada o espectador é colocado contra a parede. Várias temáticas são abordadas, a mais forte delas é com relação ao preconceito racial. Collin está em liberdade condicional e a trama nos envolve ao propor que o espectador tenha contato com o cotidiano do protagonista e de seu melhor amigo Miles. Miles é loiro, branco, de olhos azuis. A descrição física se faz necessária. No retorno do trabalho, Collin aguarda o sinal abrir. Ele observa um confronto com policiais e um suposto bandido. O policial dispara quatro tiros. O policial é branco. Do outro lado, mais um jovem negro que virou estatística nos Estados Unidos. Ser testemunha do fato o marca completamente. Collin não dorme direito só de pensar no que ocorreu. As lembranças surgem na tela por flashbacks de algo extremamente corriqueiro. Jovens negros mortos por policiais brancos.
O roteiro de Daveed Diggs e Rafael Casal, os protagonistas do longa, lembra em vários momentos o humor ácido de Corra! embalado por uma trilha com letras reflexivas sobre a sociedade e preconceito. Além da trilha com letras marcantes, a amizade entre os protagonistas pauta o arco da dupla. A química dos atores é tamanha que os diálogos encadeados transmitem a sensação de uma empolgante batalha de Rap. Todas as falas são voltadas para a imersão do espectador. A dupla lembra também os filmes de policiais, onde temos os opostos presentes na personalidade de cada um. A interessante inversão de lados torna o roteiro mais envolvente. Em determinado momento (a imagem abaixo), Collin reforça essa inversão:" Eu sempre estou aqui para te salvar. Mas o peso cai no Negrão aqui. Fala Negrão! Na realidade você é o Negrão. Você sempre foi o Negrão." E, assim, o roteiro da dupla aborda vários questionamentos sociais. Mostrar em um noticiário a foto de um policial de uniforme e do lado oposto a foto do jovem morto com roupa de presidiário reforça ainda mais os questionamentos de uma sociedade preconceituosa.
Os elementos narrativos são utilizados de forma envolvente no contexto proposto. A trilha sonora, a montagem e o som diegético proporciona ao filme um ritmo constante. Sempre que a trilha surge, a junção com os demais elementos são inseridos perfeitamente no o som de uma porta batendo ou de outros objetos cênicos. Todos os elementos reforçam a batida tão marcante do Rap americano. Ponto Cego tem outro ponto forte marcante: as atuações. Daveed entrega uma atuação empolgante e vibrante. A cada cena o ator cresce quando necessário. Apesar da condução do desfecho ser previsível, não a parte da música em si, um das melhores do filme, mas ele entrar em uma determinada casa, o duelo no terceiro ato é o ápice da atuação de Diggs. A mise-en-scène é perfeita, pois o filme em vários momentos ressalta o amigo branco do protagonista. No desfecho, Miles permanece isolado no canto da cena e quem brilha é Collin. Cada palavra mencionada só poderia sair da boca de Collin. A intensidade do ator é tamanha que refleti: " Você precisa fazer isso ( não vou mencionar, pois seria um baita spoiler), depois de anos de sofrimento e preconceito." Mas o roteiro o coloca sabiamente em uma posição de superioridade e meu pensamento vingativo caiu por terra. Já o outro lado, o do amigo branco é o tom cômico necessário e faz toda a diferença ele ser por vários momentos o protagonista.
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