Wes Anderson é sinônimo de autoria. Cores vibrantes, simetria impecável, trilha sonora com exatidão, roteiro inovador e autenticidade na direção. Com todos os elementos narrativos no lugar pode-se pressupor que tamanha precisão afaste o espectador da filmografia do diretor. Interessante perceber que mesmo sendo familiar aos elementos, os filmes de Wes Anderson geram atração pelo simples fato de sabermos o que vamos encontrar. Em Ilha dos Cachorros não seria diferente. Na animação a autoria do diretor fica nítida em cada plano. Wes Anderson consegue trabalhar como poucos a atração pelos elementos narrativos dentro da trama. O cuidado com cada detalhe nos efeitos visuais gera empatia no espectador, além do roteiro abordar temáticas extremamente atuais. Seja pelo visual ou pela trama explorada, o espectador não fica indiferente ao que é proposto pelo diretor.
O adolescente Atari Kobayashi tem um cão de guarda Spots. O laço entre cão e dono vai além da segurança e torna -se cada vez mais forte. Com um decreto estabelecido pelo prefeito Kobayashi, todos os cachorros devem permanecer isolados em uma ilha. Doenças contagiosas são constatadas e a solução inevitável é o isolamento dos cães. Em paralelo, um grupo de cientistas testa experimentos para tratar as doenças caninas, mas o prefeito não pretende utilizá-las. Extremamente ditatorial, Kobayashi forja notícias dividindo e causando pânico na população. Com os cães afastados temporariamente, o jovem Atari decide ir atrás de Spots na ilha. A alternância entre a figura do prefeito, os cientistas, os cães e os jovens dentro do roteiro é explorada com equilibrio.
A exatidão de Wes Anderson é intensificada com cores vibrantes e o mergulho na cultura japonesa. Entre os cachorros, a figura do líder Chief é representada pelo vira-lata e a política é do voto vencido. No decorrer do segundo ato, o cão torna-se sensível, mesmo camuflando seus sentimentos. Um importante questionamento atual é explorado na figura da cachorrinha Nutmeg com pensamentos e atitudes empoderadas. Ela não deseja ter filhotes e não liga para rumores sobre ter acasalado com outro cachorro na ilha. Ela deseja conhecer melhor Chief para tentar uma aproximação. Um tópico explorado por Wes Anderson com reflexo direto no mundo contemporâneo.
A animação mantém o ritmo lento e contemplativo. A trilha tem papel importante e necessário para intercalar as subtramas ao contexto principal. A trilha pulsante de Alexandre Desplat reflete diretamente a cultura japonesa, mas também emite energia e alterna o ritmo entre os atos na trama. A presença da trilha marca reviravoltas importantes. Outro elemento marcante na animação é a montagem. Com um toque sutil, os personagens transmitem um lado mais leve sempre com cortes secos. Quando o voto de Chief é praticamente inexistente, o corte na montagem é certeiro. Quando a tradutora solta várias pérolas, o corte é imediato gerando momentos de alívio e comicidade na trama.
Ilha dos Cachorros é uma animação impecável tecnicamente. Wes Anderson explora temas contemporâneos e faz o espectador refletir sobre política, lealdade, opressão, impressa imparcial, pressão da cultura japonesa nos adolescentes e empoderamento feminino. Todos elementos explorados com exatidão mesclando toques cômicos para proporcionar leveza ao filme. Impossível não sorrir com a homenagem ao gênero faroeste e a referência direta ao golpe de Daniel San em Karatê kid. Ilha dos Cachorros é uma animação envolvente pelos elementos narrativos e também por explorar temáticas presente no contexto atual. Uma animação que vai muito além das imagens.
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