A sétima arte retrata as diversas fases do ser humano em filmes que alternam gêneros. Em Olha Quem Está Falando, o espectador acompanha os primeiros meses de Mickey repletos de comédia. Já em Meu Primeiro Amor, Vada reflete sobre os encantamentos do professor de um curso de verão enquanto incentiva o melhor amigo a dar o primeiro beijo. Um drama leve e inocente. Como enfrentar a fase adulta? Um passo para a liberdade é retratado no tocante Columbus. A velhice permeia a comédia e o drama no sensível Lucky. Acompanhamos a rotina do protagonista nesta trama filosófica e existencial.
No filme, o espectador observa os dias de Lucky, um senhor de idade avançada que tem como passatempo fazer exercícios de yoga pela manhã e palavras cruzadas em jornais. O diretor John Carroll Lynch explora ao máximo a persona do protagonista. A direção transforma takes repetitivos em um cativante envolvimento do público com Lucky. A palavra chave da trama é a contemplação gradual dos olhos de quem presencia simplesmente o cotidiano do personagem.
Impossível ver Lucky na pele de outro ator. Harry Dean Stanton imprime o filme para si em um belíssimo estudo de personagem. Aos poucos o espectador cria uma empatia pelo protagonista. Um senhor que de forma introspectiva revela seus anceios e medos após compartilhar um cigarro de maconha. Harry transmite para o espectador todo vazio inserido na rotina de Lucky, aos mesmo tempo que presenciamos o olhar terno do protagonista. O jeito de andar mescla simultaneamente dificuldade e firmeza. Muitas vezes gera a dúvida em saber onde começa o trabalho do ator e onde está o lado pessoal. Harry é Lucky.
A paleta de cores modifica ao cair da noite quando descobrimos que Harry possui dificuldades para dormir e encontra no cigarro um companheiro para preencher o vazio noturno que muitas vezes é intensificado pelo medo da solidão. A edição alterna cortes rápidos proporcionando agilidade principalmente nas locações externas. A rotina sempre ganha outro viés pelo trabalho da edição. A trilha sonora também insere momentos de leveza e complementa a reflexão sobre as temáticas abordadas.
A beleza de Lucky é proporcionar ao espectador momentos de intensidade pela imensidão do olhar presente na interpretação de Harry Dean Stanton. Um belíssimo e dramático estudo de personagem que ganha nuances no sarcasmo presente no roteiro de Logan Sparks e Drago Sumonja. Uma reflexão sobre como enfrentar a solidão quando estamos cercados por pessoas que nutrem zelo por nós, mas ao cair da noite, o que resta ao protagonista é um telefone, palavras cruzadas e alguns maços de cigarro.
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