Pular para o conteúdo principal

E isso faz toda diferença. Ponto final. (Mullholland Drive)



Ter a oportunidade de rever um dos principais filmes de Lynch nos cinemas é uma questão que envolve principalmente a experiência estética caótica individual de cada espectador e na tela grande os elementos narrativos ganham uma intensidade de proporções impactantes. Mulholland Drive e a tela grande. Uma dupla, no mínimo, marcante.

Tudo na trama remete ao sonho/pesadelo vivido pelas protagonistas Rita e Betty. Após Rita sofrer um acidente de carro (estrada e carros são marcantes na filmografia do diretor), a personagem permanece durante todo o filme em um estado catatônico. Já Betty é uma aspirante à atriz que tenta se firmar em Los Angeles. A química entre Naomi Watts e Laura Harring intensifica ainda mais a proposta de que Mullholland Drive é um estético e belo sonho. A trilha sonora de Angelo Badalamenti transmite a sensação ao espectador de leveza e mistério reforçando a atmosfera sonho/pesadelo presente na trama.

A fotografia escura de Peter Deming explora a intensidade do mistério vivido pela personagem de Rita reforçado também pelo figurino preto e vermelho da protagonista. A fotografia modifica a paleta de cores quando Betty aparece pela primeira vez em cena. A luminosidade e ingenuidade presente na interpretação de Naomi são exploradas nas blusas de cores rosa e branca. No terceiro ato a atriz modifica o figurino a partir do momento que Lynch envolve ainda mais o espectador no plot twist presente no roteiro. Aliás, todo o roteiro do diretor é um imenso plot twist.



O roteiro escrito pelo diretor aborda uma temática extremamente atual: os bastidores de Hollywood. David Lynch consegue intercalar as subtramas envoltas em um grande mistério e com personagens caricatos o humor é certeiro. Aos poucos o espectador se envolve entre pistas e recompensas entregues imersos na estética perturbadora do diretor.

Uma caixinha, uma chave, um casal de velhinhos, um personagem que aparece sem nexo, atuações marcantes, trilha sonora pontual, roteiro crítico com pitadas de humor refinado e protagonistas que estão perdidas pelas circunstâncias ou pelo fluxo constante de um sonho. Poderia ser um filme mediano, mas é uma obra de David Lynch. E isso faz toda diferença. Ponto Final.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

"Isso parece uma novela" (Bad Boys Para Sempre)

O começo de Bad Boys Para Sempre é basicamente um resgate do primeiro filme dirigido por Michael Bay. Mike e Marcus estão em um carrão em alta velocidade trocando ofensas e piadas enquanto percegue suspeitos. Além de todas as referências, a trama gira em torno de vingança, uma vingança mexicana. Sim, os vilões são mexicanos. Bandidos de um lado, policiais do outro e segredos revelados.  Will Smith sabe como lucrar na indústria, apesar de algumas escolhas equivocadas em projetos passados, Bad Boys Para Sempre parece uma aposta acertada do produtor. Desde o primeiro longa a química entre os atores é o que move a trama e na sequência da franquia não seria diferente. Martin e Will são a ação e o tom cômico da narrativa. Os opostos são explorados de forma intensa. Martin está mais contido com a chegada do neto e Will na intensidade de sempre. As personalidades se complementam apesar da aposentadoria momentânea de Marcus. Tudo ganha contornos diferenciados quando a família em to...

O Mito. A lenda. O Bicho-Papão. (John Wick : Um Novo Dia Para Matar)

Keanu Reeves foi um ator que carregava consigo o status de galã nos anos 80. Superado o estigma de ser mais um rosto bonito em Hollywood, o que não se pode negar é a versatilidade do astro ao escolher os personagens ao longo de décadas. Após a franquia Matrix, Keanu conquistou segurança ao poder escolher melhor os personagens que gostaria de interpretar. John Wick é o novo protagonista de uma franquia que tem tudo para dar certo. Um ator carismático que compreendeu a essência do homem solitário que tinha com companhia somente um cachorro e um carro. Após os eventos do primeiro filme, De Volta ao Jogo, Keanu retorna com John Wick repetindo todos os aspectos narrativos presentes no filme de 2014, mas com um exagero que faz a sequência ser tão interessante quanto o anterior. O protagonista volta aos trabalhos depois de ter a casa queimada. Sim, se as motivações para toda a ação presente no primeiro filme eram o cachorro e um carro, agora, o estopim é uma casa. Logo na primeir...

Não, não é uma crítica (Coringa : Delírio a Dois)

Ok, o título estampado no cartaz é: Coringa: delírio a dois. Podemos criar expectativas que a continuação é um filme do Coringa, correto? Na realidade, o que Todd Phillips nos apresenta e faz questão de reforçar a cada cena é que temos o Coringa, porém, o protagonista é Arthur Fleck, um homem quebrado físicamente e mentalmente. Temos também Lee Quinzel, que projeta no outro um sentido na vida e começa a manipular Arthur, para que Arlequina venha à tona. Podemos refletir sobre a manipulação da personagem, ela inclusive reforça:"Não assisti ao filme vinte vezes, talvez umas quatro ou cinco. Quem não mente?". Mas dizer que ela é culpada pelas atitudes de Arthur/ Coringa? A coerência existe no fato da personagem possuir um transtorno mental e, por isso, justifica o desejo e manipulação. Agora, qual a necessidade de criar uma pauta inexistente? O grande equívoco talvez seja do próprio estúdio em não vender o filme como musical e gerar expectativas equivocadas no espectador. É um f...