Pular para o conteúdo principal

A vida constantemente ameaçada (Human Flow: Não Existe Lar se Não há para Onde Ir)


O Poder do documentário Human Flow: Não Existe Lar Se Não Há Para Onde Ir está nas imagens. O diretor Ai Weiwei percorreu durante um ano 23 países para explorar e demonstrar em um tom poético a vida ou para utilizar uma palavra mais apropriada, a sobrevivência. O filme foca em famílias que buscam um pouco de esperança nos constantes deslocamentos fugindo de guerras, fome e perseguições políticas. 

As imagens refletem um ritmo lento para que o espectador compreenda o quanto é penoso o deslocamento e o trageto percorrido pelos refugiados. Os planos gerais são essenciais para ter a dimensão do local e as conduções precárias em que as famílias são submetidas. A falta de recursos básicos contrasta com belas imagens do oceano que dia após dia transporta pessoas em busca de uma vida melhor. A dualidade presente nas imagens é reforçada pela beleza presente nos trechos de poetas que proporcionam ao documentário uma leveza passageira. 

Ai Weiwei por diversos momentos se torna coadjuvante do filme, pois sempre está próximo dos entrevistados. Entre um depoimento e outro, ele se posiciona com um olhar observador e extremamente pessoal por ele ser também um refugiado. Aqui, o olhar do diretor transforma-se em depoimento presente principalmente nas cenas em que Weiwei participa de manifestações culturais ou quando raspa a cabeça. A sensibilidade vai além das imagens e toca diretamente o espectador.


Por priorizar as imagens, os depoimentos são breves. Os entrevistados são movidos pela emoção e desespero de não saberem quando a ajuda poderá chegar ou se vão sobreviver. Muitos não conseguem expressar o que desejam, somente sentem a angústia de não terem mais nacionalidade. Os relatos são alternados por leves momentos culturais e centrados na inocência de brincadeiras infantis. Por mais belas que sejam as tomadas feitas pelo diretor, o documentário ganha um aspecto cansativo por explorar repetidas imagens. As autoridades voltadas para os representantes dos direitos humanos e ONU proporcionam depoimentos importantes em tom de denúncia mesmo sendo restritos. 

Human Flow: Não Existe Lar Se Não Há para Onde Ir é um documentário em que as imagens falam por si só. Repleto de metáforas sempre voltadas para o aprisionamento, Ai Weiwei reforça a necessidade de voltarmos nosso olhar para os seres humanos que lutam diariamente pela sobrevivência nos campos de refugiados. Os protagonistas de Human Flow desejam a tão aguardada liberdade, mesmo que para isso a vida esteja constantemente ameaçada. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

E o atendente da locadora?

Tenho notado algo diferenciado na forma como consumimos algum tipo de arte. Somos reflexo do nosso tempo? Acredito que sim. As mudanças não surgem justamente da inquietação em questionar algo que nos provoca? A resposta? Tenho minhas dúvidas. Nunca imaginei que poderia assistir e consumir algum produto em uma velocidade que não fosse a concebida pelo autor. A famosa relíquia dos tempos primórdios, a fita VHS, também nos aproximava de um futuro distópico, pelo menos eu tinha a sensação de uma certa distopia. Você alugava um filme e depois de assistir por completo, a opção de retornar para a cena que mais gostava era viável. E a frustração de ter voltado demais? E de não achar o ponto exato? E o receio de estragar a fita e ter que pagar outra para o dono da locadora? Achar a cena certinha era uma conquista e tanto. E o tempo...bom, o tempo passou e chegamos ao DVD. Melhoras significativas: som, imagem e, pasmem, eu poderia escolher a cena que mais gostava, ou adiantar as que não apreciav...

Entretenimento de qualidade (Homem-Aranha no Aranhaverso)

Miles Morales é aquele adolescente típico que ao grafitar com o tio em um local abandonado é picado por uma aranha diferenciada. Após a picada, a vida do protagonista modifica completamente. O garoto precisa lidar com os novos poderes e outros que surgem no decorrer da animação. Tudo estava correndo tranquilamente na vida de Miles, somente a falta de diálogo com o pai o incomoda, muito pelo fato do pai querer que ele estude no melhor colégio e tudo que o protagonista deseja é estar imerso no bairro do Brookling. Um dos grandes destaques da animação e que cativa o espectador imediatamente é a cultura em que o personagem está inserido. A trilha sonora o acompanha constantemente, além de auxiliar no ritmo da animação. O primeiro ato é voltado para a introdução do protagonista no cotidiano escolar. Tudo no devido tempo e momentos certos para que o público sinta envolvimento com o novo Homem-Aranha. Além de Morales, outros heróis surgem para o ajudar a combater vilões que dificultam s...

Não, não é uma crítica (Coringa : Delírio a Dois)

Ok, o título estampado no cartaz é: Coringa: delírio a dois. Podemos criar expectativas que a continuação é um filme do Coringa, correto? Na realidade, o que Todd Phillips nos apresenta e faz questão de reforçar a cada cena é que temos o Coringa, porém, o protagonista é Arthur Fleck, um homem quebrado físicamente e mentalmente. Temos também Lee Quinzel, que projeta no outro um sentido na vida e começa a manipular Arthur, para que Arlequina venha à tona. Podemos refletir sobre a manipulação da personagem, ela inclusive reforça:"Não assisti ao filme vinte vezes, talvez umas quatro ou cinco. Quem não mente?". Mas dizer que ela é culpada pelas atitudes de Arthur/ Coringa? A coerência existe no fato da personagem possuir um transtorno mental e, por isso, justifica o desejo e manipulação. Agora, qual a necessidade de criar uma pauta inexistente? O grande equívoco talvez seja do próprio estúdio em não vender o filme como musical e gerar expectativas equivocadas no espectador. É um f...