Revisitar um clássico. Algumas cenas causam impacto diferenciado. Atualmente, o espectador é imerso em todos os detalhes e a tensão criada na trama torna-se previsível. Após rever O Bebê de Rosemary, a sutileza ao explorar a atmosfera envolvente sem expor o roteiro repleto pistas e recompensas dentro do gênero, o faz ser um clássico relevante na sétima arte por várias décadas.
A atmosfera cotidiana presente no primeiro ato conduz o espectador a permanecer inserido na trama. O trabalho competente de todo o elenco eleva a tensão gradativamente. Mia Farrow transparece o ar inocente, tanto no figurino, com destaque para cores claras e estampas florais, quanto no cabelo preso. John Cassavetes inspira no espectador a sensação de uma linha tênue entre melancolia e tensão reprimida. O destaque fica por conta do solícito casal de vizinhos interpretados por Ruth Gordon e Sidney Blackmer. Ambos são a alma do clássico, os atores exploram a inconveniência dos personagens ao mesmo tempo que são o real perigo para Rosemary.
A construção da mise-en-scène reflete aos poucos a sugestão de que algo está realmente acontecendo e que não se trata somente de alucinações da protagonista. Na cena específica em que Roman encontra "casualmente" Hutch no apartamento da protagonista podemos observar a sutileza presente na posição dos atores que evidência propositalmente a interpretação de Sidney. O ator sugere que o assunto abordado pelos personagens complementa o terceiro ato e ressalta um leve tom irônico como quem pensa: " Ela está perto. Quase descobrindo" .Neste caso a protagonista é o espectador. Aos poucos encaixamos as pistas e recompensas que o roteiro nos proporciona.
Rever O Bebê de Rosemary é como ter uma experiência de volta ao passado. O ritmo do clássico é lento, reflexo direto da montagem que reforça a cada cena a gradação e poder da sugestão tensa presente na metade do segundo ato até o desfecho. O que pode causar ruídos nos dias atuais é a interpretação marcada de Mia Farrow. A cena em que a protagonista fica tonta e desmaia é abrupta e atualmente ganharia um tom forçado. Para a época e imaturidade da atriz (primeiro trabalho de Mia nos cinemas), não causaria tanto impacto. A atriz recebeu várias indicações e ganhou o devido destaque em Hollywood.
A direção segura de Roman Polanski atraí o olhar do espectador logo após o corte das cenas para o direcionamento de plano detalhe em objetos cênicos significativos. O pingente da protagonista, o copo de vitamina e o local onde Rosemary esconde os medicamentos. Esses objetos acrescentam nas recompensas que o espectador terá ao longo da trama.
Além do figurino em tons claros, o vermelho aparece pontualmente em momentos marcantes da protagonista. Na cena em que Rosemary está na festa e sente muita dor, esse momento reflete a perturbação de que algo estranho está acontecendo. A personagem utiliza um tom mais escuro quando corta o cabelo. A mudança radical no visual marca o avanço na gestação e também os problemas que ela irá enfrentar.
O Bebê de Rosemary prende o espectador pelos elementos narrativos explorados de forma coesa dentro da trama. O tom em um figurino, o plano detalhe de um objeto, o corte de cabelo reflexo das mudanças e perda da inocência, as interpretações e direção segura de Polanski reforçam as pistas e recompensas dentro do roteiro. Esses elementos elevam a sugestão de tensão do clássico que está presente no imaginário de cada espectador. Ter a sugestão do balanço de um berço é a melhor recompensa.
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