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Um filme de altos e baixos (Jackie)


A narrativa do filme Jackie explora os quatro dias posteriores ao assassinato do ex- presidente dos Estados Unidos John F. Kennedy. A angústia da primeira dama ao lidar com a pressão política e o trauma familiar no decorrer dos dias são a temática do roteiro. Pensar em uma trama que foque somente neste contexto poderia ser enfadonho para o espectador e em alguns momentos o filme realmente toma para si um ritmo extremamente lento. 

Para quebrar e alternar o ritmo, a montagem de Noah Oppenheim é o elemento narrativo de grande destaque. O filme explora momentos diferenciados no decorrer dos quatro dias. Se a montagem ressalta passagens em que Jackie Kennedy mostra aos telespectadores um tour pela Casa Branca, Noah equilibra e retoma o ritmo com cenas de diálogos reflexivos sobre fé e religião com o padre interpretado por John Hurt. O mesmo acontece com o jornalista Theodore White vivido por Billy Crudup. Essa alternância no decorrer do filme evidência a importância da montagem, mas também imprime na narrativa uma atmosfera inconstante de altos e baixos.

Logo nas primeiras cenas, Natalie Portman mostra ao espectador que o filme está centrado em um trabalho minucioso de construção da personagem. Os trejeitos, a maneira de andar e o timbre de voz são precisos e valem as indicações ao Globo de Ouro e Oscar. A questão é que ao longo da trama, o tom de voz da protagonista causa desconforto e até um princípio de sonolência. É cansativo acompanhar Jackie mostrando a Casa Branca, em cenas que não acrescentam nada no contexto dramático e mesclada com o timbre de voz, o ritmo cai significativamente. O trabalho de Pablo Larraín com a atriz é semelhante ao realizado de Steve McQueen com Michael Fassbender em Shame. Assim como em Shame, a alma e poder do filme eram proporcionados pelo protagonista, o mesmo acontece com Natalie ao interpretar Jackie. Vale ressaltar também o trabalho do veterano John Hurt, como um padre que acalenta e proporciona questionamentos sobre o papel da fé no momento conturbado vivido pela personagem.



A direção de arte exala a elegância da protagonista. O filme explora a todo o momento o figurino marcante de Jackie. A reconstituição da Casa Branca e os pequenos detalhes na vestimenta fazem à narrativa ganhar um toque importante que reflete na personalidade da personagem. No começo do terceiro ato, Jackie se despede de cada canto da casa e como em um desfile troca de roupas como quem aos poucos se deixa levar pelo saudosismo.

Pablo Larrarín centraliza os personagens e é preciso ao compor a mise- en-scène. Hora a protagonista está focalizada de forma intensa, hora frente a frente com os coadjuvantes, sempre compondo os elementos de forma equilibrada em cena. Jackie é uma narrativa que explora momentos marcantes da protagonista e a visão feminina de um fato significativo para os americanos, mas peca pelos altos e baixos gerados no ritmo ao longo de todo o filme.  

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