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Dois pesos e duas medidas (Boa Noite, Mamãe!)


Lukas e Elias, irmãos gêmeos, aguardam a chegada da mãe. Ela, com o rosto coberto devido a diversos procedimentos cirúrgicos, em um primeiro momento, desperta a desconfiança dos filhos. Será que esta pessoa é realmente mãe dos irmãos?  Os diretores, Veronika Franz e Severim Fiala, instigam o espectador durante todo o filme em busca de respostas. O que poderia ser facilmente mais um drama familiar, nas mãos criativas da dupla, ganha um tom sombrio, claustrofóbico e extremamente tenso. A cada cena, uma atração inevitável é estabelecida com o público, um misto de curiosidade e medo é gerado como fio condutor da trama. 

Todos os elementos clichês dos filmes de terror estão presentes em Boa Noite, Mamãe! O olhar frio e distante dos irmãos, uma casa isolada e a tensão representada pela figura materna. O grande trunfo do filme é não ter receio de inovar. Todos os aspectos mencionados ganham diferentes proporções a medida que somos imersos na história. Cada canto da casa é explorado com tamanha riqueza de detalhes que os cômodos também são importantes personagens que auxiliam e intensificam a tensão gerada no espectador. A ausência de diálogos é proposital pois, o principal personagem, a casa, já nos ambienta é concentra toda a carga dramática que o filme necessita.

Devidamente ambientados no universo proposto somos levados a nos indagar em diversos momentos da trama. Será que é realmente o que estou pensando? E cada vez mais o espectador vira refém dos irmãos. Cada passo dado por eles também é inserido o olhar do espectador, sempre levantando questionamentos. Mesmo que você consiga decifrar o contexto da trama, logo no começo, este aspecto não influencia negativamente no decorrer da história porque sempre somos surpreendidos em diversos momentos.

Claro que todo risco também pode causar desconforto e em determinado momento do filme, o que era inovador ganha um aspecto questionador. Qual a necessidade de modificar os rumos da trama? Mais próximo do desfecho, os garotos ganham toques semelhantes aos dos adolescentes de Violência Gratuita de Michael Haneke. Capazes das maiores atrocidades para justificar um fato que poderia simplesmente ter ficado na expectativa gerada pelo suspense e terror. São dos pesos, o drama e a tensão, que não conseguem acompanhar as medidas escolhidas pelos diretores fazendo do desfecho da trama algo incoerente com todo o contexto proposto.         
     

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