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Sobre gerações, confidências e feijão. (O Sabor da Vida)




Não é de hoje que a sétima arte utiliza a culinária como pano de fundo para contar histórias dramáticas ou simplesmente nos fazer rir, em O Sabor da Vida, de Naomi Kawase, a temática é retratada da melhor maneira possível, com extrema leveza. 

A trama gira em torno de dois personagens opostos: Sentaro, um homem envolto em silêncio e Tokue, uma senhora que reflete carisma e um toque delicado de ingenuidade. Ele trabalha em uma padaria, ela se oferece para ajudá-lo no preparo de um doce, mais conhecido como dorayakis. O segredo está no preparo do feijão vermelho que é feito como se fosse um verdadeiro ritual pela senhora. No decorrer da trama percebemos que a comida é somente o fio condutor de segredos que serão revelados aos poucos. 


O grande trunfo da diretora é explorar ao máximo a relação de ambos, mas tudo em seu devido tempo. Não há pressa em contar uma história com temas profundos que facilmente poderia ser carregado na dramaticidade nas mãos de outro diretor. Tudo é explorado de forma bem delicada e singela. A relação de ambos ganha profundidade somente na troca de olhares. A medida que o relacionamento avança, os conflitos são abordados e cada um compreende a prisão interna existente no outro.

A trilha sonora aparece em momentos cruciais, onde cada personagem expressa seus sentimentos por cartas, algo raro nos dias atuais. A trama aborda a questão dos ensinamentos e a experiência que é transmitida de uma geração para outra de uma forma extremamente poética. A natureza é mencionada em diversos momentos como metáforas para a liberdade que cada um conquista ao conhecer o outro.Um filme tocante que nos faz refletir sobre os conflitos internos e preconceitos que cada um de nós carregamos ao longo da vida.


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