Bate Coração transmite uma mensagem importante: a doação de órgãos. Acontece que durante os atos às subtramas que poderiam quebrar estereótipos apenas os ressalta de forma caricata e desrespeitosa. Objetivar a figura feminina nos dias atuais? Vale confundir o tom cômico com puro machismo? São algumas das temáticas equivocadas do filme. Em Bate Coração Sandro recebe o coração de Isadora. Tudo volta ao normal, mas Sandro começa a desenvolver um olhar feminino mais apurado. Isso porque Isadora não somente se vestia de mulher como também se sentia mulher. Ao longo dos atos o protagonista reflete sobre os pensamentos preconceituosos que o moveram durante boa parte da trama, mesmo que por segundos, e assim, consegue perceber que a vida lhe deu uma segunda chance.
O roteiro escrito também pelo diretor Glauber Filho reforça estereótipos, seja no núcleo de Isadora, ou no núcleo de Sandro. O personagem Igor reforça a comicidade na trama de uma forma totalmente equivocada. O personagem respira e salta uma pérola atrás da outra. O pior é que ainda existe aos montes homens com esse tipo de comportamento. O pior são os sons emitidos para transformar a mulher em um simples objeto. Uma figurante vira alvo. O protagonista possui camadas que faz o espectador notar algumas mudanças no comportamento de Sandro. O problema é que essas mudanças são exploradas de forma abrupta, não existe tempo para que o público sinta as transformações do protagonista. Agora, o arco de Isadora é mais detalhado e envolve o espectador. Aos poucos, pela personagem Vera, o roteiro intensifica os conflitos internos de Isadora. A pressa é sentida também nas reviravoltas. Quando Igor pega o diário de Isadora e no mesmo instante Davi percebe a ausência do objeto, ou no momento em que Davi ressalta que o pai deixou a família para ficar com uma mulher ou virar uma mulher, Vera afirma: " Precisamos ter uma conversa.", e neste momento de "esclarecimento" para o público o diretor opta pela montagem e corta a cena. Outras tantas são interrompidas ao longo do filme.
A direção de Glauber Filho reforça a falta de timing e entrosamento do elenco. O núcleo de Sandro é o que deixa esse aspecto mais evidente. As cenas com os amigos Sandro e Igor são apressadas e as falas são sobrepostas causando ruído na comunicação com o espectador. Em vários momentos não há compreensão do que os atores falam em cena. Já no núcleo de Vera, no salão, o timing é mais calmo e o espectador compreende melhor as cenas. A direção de Glauber é simples com repetições de planos gerais combinadas com a narração em off. No terceiro ato, quando o roteiro foca na temática da doação de órgãos e no desfecho do arco de Isadora existe certa calma na direção.
O que realmente envolve o espectador é o trabalho de composição Aramis Trindade. O ator transmite sensibilidade para Isadora. Muito além de um ator vestido de mulher. O lado cômico funciona de forma leve e suave no personagem. A interação de Isadora com o seu guia espiritual atrai risos espontâneos do espectador. Uma pena que o filme consiga somente perto do desfecho proporcionar um ritmo mais calmo para o espectador. A pressa presente no núcleo de Sandro e a forma como o machismo é explorado na figura de Igor transmitem mensagens retrógradas para os dias atuais.
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